"Covardes não são homens que choram por amor,mas 
sim homens que não amam por medo de chorar"

 


                             Só mais um passo 

 
  
Guillormée pilotava sobre a cordilheira quando seu pequeno monomotor sofreu uma pane, caindo sobre a montanha de neves eternas. Embora não tivesse se ferido gravemente, suas pernas apresentaram profundos cortes e sérios ferimentos.

    Com muito esforço, sentindo fortes dores, ele abandonou a cabine do avião destroçado. Ao constatar a extensão dos ferimentos, compreendeu que não teria como sair dali sozinho. Perscrutou o horizonte em todas as direções e só viu solidão gelada.
   
    Conhecedor da região, após rápida análise, entendeu que seu fim estava próximo, principalmente em razão dos sérios ferimentos que sofrera nas pernas. Por um instante sentiu-se tomado de pânico e pela dor de saber que chegava ao fim de seus dias.

    Pensou na família que não tornaria a ver, nos amigos, nas tantas coisas que ainda pretendia realizar e na impotência de não ter a quem pedir socorro.

    Depois, já mais conformado, pôs-se a pensar sobre as medidas a tomar. 
Não havia nada a fazer no sentido de sobrevivência, portanto o mais 
sensato seria deitar-se na neve e esperar que o torpor causado pelo 
frio tomasse conta de seu corpo, permitindo-lhe ser envolvido, sem dor, 
pelo manto da morte.

    Deitado sobre a neve, Guillormée dirigiu o pensamento a seus filhos, que 
ele não veria crescer e à esposa, de quem tanto gostava. Aquele homem de espírito forte, batalhador, lutava consigo mesmo para resignar-se à situação.
   
    "Meu consolo - pensava ele - é saber que eles não ficarão desamparados; meu seguro de vida tem cobertura suficiente para proporcionar-lhes subsistência por muito tempo. Menos mal! Felizmente tive o bom senso de 
estar preparado para uma situação destas; tão logo seja liberado meu atestado de óbito, a companhia de seguros...".

    Neste instante, Guillormée teve um sobressalto; sua apólice rezava que 
o seguro só seria pago mediante a apresentação do atestado de óbito. 
Ora, naquele lugar inacessível, seu corpo jamais seria encontrado; 
ele seria dado por desaparecido. Não haveria, pois, atestado de óbito.

    Passar-se-iam anos de privações para sua família, antes que ele fosse oficialmente considerado morto. Apavorado com essa idéia, ele pensou: 
"A primeira tempestade de neve que cair soterrará meu corpo; nunca
  irão me achar. Preciso caminhar até um lugar onde meu corpo possa ser encontrado".

    As dores que sentia eram cruciantes, mas sua determinação era maior. 
Ele sabia que, ao pé da cordilheira, havia um povoado cujos moradores costumavam aventurar-se até certa altura da montanha, para caçar.

    A distância era longa - vários quilômetros -, mas ele precisava realizar 
a última proeza de sua vida: chegar até onde seu corpo pudesse ser 
encontrado por um caçador. Reunindo todas as forças que ainda lhe
  restavam, obrigou-se a ficar em pé. Foi preciso um esforço hercúleo 
para não cair.

    Consciente da distância que teria de percorrer e sabedor de que não 
podia permanecer naquele local, apesar de seu estado lastimável, 
Guillormée estabeleceu a meta de dar um passo. Jogou um passo 
a frente e disse:
"Só um passo!". Com extrema dificuldade empurrava a outra perna 
e repetiu: "Só mais um passo!", e de novo: "Só mais um passo!".

    Concentrando toda a sua energia apenas no próximo passo e 
estabelecendo um forte condicionamento positivo - através do comando 
"só mais um passo"- ele caminhou quilômetros pela neve. Não se permitia pensar na distância que  ainda faltava percorrer, ou em sua dificuldade 
para se locomover; concentrava-se apenas no espaço a ser vencido 
pelo passo seguinte.

    Assim caminhou o dia todo. A tarde já ia avançada quando seus olhos, 
turvos pela dor e pelo cansaço, vislumbraram alguns vultos à sua frente; 
firmou o olhar e percebeu que se tratava de pessoas que olhavam 
estupefatas, para ele. "Agora eu já posso morrer", pensou, e deixou-se escorregar para o nada.


    Dias depois, já no hospital, abriu os olhos e a primeira imagem que 
viu foi a da esposa, a seu lado.
Guillormée teve alguns dedos de um dos pés amputados, que foram
  congelados pela neve. Passou algum tempo hospitalizado, até 
readquirir forças, mas continuou vivo ainda por muito tempo.

    Ao narrar esse episódio acontecido com seu amigo, Saint-Exupéry 
relata  a determinação desse homem valente e ressalta o fato de que foi a 
fixação da meta a curtíssimo prazo ("só mais um passo") que lhe proporcionou força e ânimo bastante para vencer a dura prova pela qual passava.

    Tivesse ele pensado na enorme distância a ser percorrida, na situação 
física precária em que se encontrava, e muito provavelmente não teria encontrado forças para alcançar o objetivo a que se determinou no alto da montanha.
Esse exemplo deixa bem clara a importância da estipulação de metas bem definidas; a curto prazo (só mais um passo); a médio prazo (chegar ao 
pé da montanha); a longo prazo (ter seu corpo localizado), para a 
realização de qualquer objetivo proposto.

    Em vez de permitir que suas forças se exaurissem, ao pensar no imenso esforço a ser dispendido - olhando o objetivo como um todo - estilação de metas a curto, médio e longo prazos, permitiu-lhe total concentração de energia no ponto mais próximo, que era dar o primeiro passo. Assim, cada
etapa vencida foi mais um ponto de concentração de energia, em lugar da dispersão da mesma.

    Ao estabelecer, portanto, um objetivo, divida o alvo a ser atingido. 
Uma vez esquematizado o plano de ação e acionado o esquema de 
andamento de seu programa, bastarão os pequenos passos para 
que o ritmo seja mantido.
Se uma emergência obrigá-lo a fazer mudanças nos planos, os ajustes 
também poderão ser feitos com pequenos passos complementares. 
Mas para tanto é necessário saber para onde você quer ir.
Sucesso na jornada!

 
A primeira condição para se realizar alguma coisa, é não querer 
fazer tudo ao mesmo tempo.

Bom dia!!!

2082
Maktub

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