Ela sentou-se na entrada, tentando lutar contra o vento cortante. Com
um fino cobertor sobre os pés, pareceu pequena e vulnerável, mas eu
sabia que deveria ser resistente - muito mais forte do que eu. Foi a
única pessoa desabrigada nas ruas de San Francisco que não nos pediu
dinheiro. Nunca, nem uma vez.
Quando pegamos nosso táxi na frente do hotel, nós a vimos pela
primeira vez. Eu gostei dela porque não estava bebendo, ela não
estava agressivamente pedindo dinheiro enquanto muitos outros
desabrigados estavam.
Ela estava lendo. Agarrada a seu livro, tentava capturar a última luz
daquele dia de inverno.
Pensei nela pelo resto do dia. Eu gostaria de saber o que a levou àquele
jeito desolado e frio, de fome e de solidão. Eu me virava em nossa
cama limpa e quentinha do hotel, sabendo que ela estava lá fora, em
algum lugar, com nada mais do que um cobertor e um livro.
Cada vez que saíamos do hotel, nós a víamos em um ponto diferente,
sempre sozinha e lendo seu livro. Nunca respondeu ao meu carinhoso
"Olá!" e eu percebi que ela queria apenas ser deixada
sozinha.
Certa noite, quando voltávamos ao hotel, meu marido e eu conversamos
sobre a mulher. Nós queríamos fazer algo por ela, mas não sabíamos
como reagiria, já que nunca pediu nada e parecia confiar somente em
si mesma. Mas, no fundo do meu coração, eu sabia que não poderia
partir sem fazer algo.
Fiz uma rápida oração, pedindo a Deus que nos inspirasse. Antes de
chegar ao hotel, encontramos uma loja de departamento e entramos para
tentar encontrar o presente certo para nossa amiga.
Um par de luvas foi a primeira sugestão de meu marido. Encontramos um
perfeito par de luvas vermelhas, grossas, de lã e sorrimos, sabendo
que as mãos agora estariam aquecidas. Como era ávida leitora, o item
seguinte em nossa lista foi uma boa lanterna e baterias extras.
Adicionamos um pequeno banquete e fomos em busca do último presente
que sabíamos que deveríamos dar. Nos dirigimos para a livraria e,
mais uma vez, fiz uma rápida oração pedindo por orientação.
Comprar um livro para alguém é realmente difícil, principalmente se
você não tem idéia do que a pessoa gosta de ler. Quase
imediatamente andei exatamente até o livro certo. Senti uma deliciosa
emoção quando li o nome do autor, meu favorito, Maya Angelou. Suas
histórias e poesias falam de épocas difíceis e de determinação e
força interna. Eu sabia que alcançaria a alma daquela mulher e lhe
traria conforto durante o amargo inverno que enfrentava.
Voltamos apressados ao hotel e lá estava ela, lendo seu livro, seus pés
descansando sob o fino cobertor. Tentei o meu "olá!" e mais
uma vez sem resposta. De algum modo eu sabia que seria um presente
muito mais para mim do que para ela.
Subimos ao nosso quarto e rapidamente colocamos nossos presentes em um
bonito saco de Natal. Escrevi uma dedicatória na capa do livro
"Você é amada!". E fomos ao seu encontro na entrada do
hotel.
Estava vazia.
Olhamos ao redor e não pudemos vê-la em nenhuma parte. Com lágrimas
nos olhos, percebi que não deveria ter perdido tempo com embalagens.
Andamos por muitas ruas e voltamos para o hotel sem termos encontrado
a mulher. Onde ela estaria? Estaria congelando-se ou com medo? Eu não
conseguia parar de pensar naquela mulher sozinha e perdida em uma
cidade tão grande. Agora, tudo que eu poderia fazer por ela era orar.
Pelo resto dos dias em que ainda permanecemos na cidade, nós a
procuramos. E nenhum sinal.
Algumas horas antes de partir, resolvi dar uma última volta no
quarteirão.
E lá estava. Corri até ela, dei-lhe um sorriso e lhe entreguei nosso
presente.
Ela pegou o saco e sem hesitação olhou o que tinha dentro. Ela
olhava, alternadamente, para o saco e para mim
- Oh, Obrigado! Um presente de Natal. Obrigado!
Meio sem jeito, eu disse,
- Eu queria apenas que soubesse... Você é amada.
Ela ficou me olhando, surpresa e com lágrimas nos olhos, enquanto eu
me afastava com as pernas tremendo.
Nunca me esquecerei daquela mulher que enfrenta a vida muito difícil
com serenidade, dignidade e coragem. Espero que esteja em algum lugar
aquecido e seguro e que saiba que é amada.
Nunca pediu nada, mas o que me deu permanecerá para sempre em minha
vida.
Susan Farr Fahncke
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