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O PowerPoint e a transmissão
de conhecimento
O programa de criação de slides pode emburrecer as pessoas, deu no New York
Times. Não exatamente. Se não for usado de forma vazia, claro que é possível
criar conhecimento e provocar reflexão.
Alexandre Bobeda
Você certamente já viu uma apresentação de algum assunto, projeto, trabalho
ou qualquer outra coisa que exija uma exposição oral do tema criada em
PowerPoint? É muito provável, acredito!
Mas eu estive pensando, após perceber que tenho dezenas de arquivos para esse
excelente programa de criação de slides, se seria possível juntá-lo com
conceitos básicos de comunicação (que seria essencial) e Gestão do
Conhecimento (que seria acessório).
Vi muita alegoria, cores, (falta de) informações e efeitos no material
encontrado. Logo, imaginei como poderia ser uma bela apresentação, em amplo
sentido, cuja performance daquele que discursa transmitisse e/ou criasse
conhecimento. Infelizmente, não é assim que nos acostumamos a usar o
PowerPoint.
Dependendo da forma como as apresentações são feitas, pode-se extrair o
conhecimento do palestrante ou de quem quer que esteja envolvido, claro, de
acordo com sua disposição ou disponibilidade para o fato.
Ainda que haja em cada slide um texto próprio e muitas vezes resumido e ditado
por palavras-chave, o êxito da exposição depende em grande parte – senão
totalmente – da habilidade e do conhecimento do “apresentador”, que
incluirá, a cada imagem na tela, algum comentário, insight, alguma experiência
própria, um case ou uma forma de contar estórias e de exemplificar
acontecimentos que provavelmente deixará uma significativa diferença para a
platéia. É preciso lembrar que a apresentação, arquivo ou documento, é uma
só, mas a exposição é infinita.
Embora de forma quase polêmica e arrogante o todo-poderoso “New York Times”
afirmara certa vez que o PowerPoint “torna as pessoas idiotas”, é preciso
discordar se olharmos a questão à luz dos temas caros à Gestão do
Conhecimento, como o capital intelectual, compartilhamento de conhecimento,
elaboração de estórias, entre outros e tentarmos entender que o inofensivo
programa (da nem tão inofensiva assim Microsoft) apenas faz com que determinado
assunto seja mostrado a alguma platéia de forma visual, lúdica e direta,
baseada em palavras que transmitam a idéia central, fixando-a na mente com
certa facilidade.
Por essa razão, evitando o “emburrecimento” dos
interlocutores/espectadores, uma digressão para a área da Semiologia, que é a
ciência que estuda os sinais e a arte de empregá-los, faz-se necessária como
forma de relacionar “exposição” e “conhecimento”.
Segundo Roland Barthes, intelectual francês e crítico literário que se
aprofundou no estudo da comunicação, tudo começa com o signo, ou seja, com um
elemento que substitui o objeto que precisa ser conhecido, representando-o e
apresentando-o a um indivíduo.
Profundamente confuso, mas imagine uma apresentação de slides com uma figura
qualquer e uma ou várias palavras aparecendo na tela, sem concatenação,
deliciosamente desconexas, coloridas em tons berrantes e que não deixa muito ao
final, a não ser cumprimentos pela pirotecnia vazia apresentada. É o preço
pela falta de objetividade e clareza na comunicação. Não cria conhecimento
nem provoca a reflexão.
Para Barthes, um dos elementos do discurso é o binômio denotação/conotação.
A denotação é a significação óbvia do signo, o que é transmitido. A
conotação é quando o signo se encontra com os sentimentos e emoções –
talvez com o conhecimento também, vejamos – de quem o usa e com os valores da
sua cultura.
É o que se percebe em uma apresentação feita em PowerPoint, na qual o próprio
conteúdo físico (uma figura, animação, texto, foto etc) se relaciona, quando
tornado oral, retransmitido pelo “apresentador”, com uma mensagem
complementar, de acordo com o estilo de quem o apresenta e com seu próprio
expertise, seu capital intelectual.
Essa exposição do conteúdo por um profissional qualquer é a base do
conhecimento e sua gestão através do PowerPoint, já que se trata de um outro
sentido para o que é mostrado, com tratamento e abordagem únicos do que passa
na tela por parte desse profissional, de quem a exposição reflete a transferência
de conhecimento tácito que, logo a seguir, evoluirá a explícito.
Portanto, adaptando as definições para o conhecimento de Ikujiro Nonaka e
Hirotaka Takeushi, em Criação do Conhecimento na Empresa, durante uma
apresentação de slides com esse famoso programa, poderíamos identificar dois
fatores:
Socialização do conhecimento: de tácito para tácito – quando há uma
interação real e completamente livre entre quem expõe o conteúdo e sua platéia,
compartilhando conhecimento de ambos os lados, valores, soluções e formas de
encarar problemas já experimentados (sentido de comunidade).
Externalização do conhecimento: tácito para explícito – a apresentação
com o diferencial de quem expõe o conteúdo, combinando cada slide com suas próprias
explicações, metáforas, analogias e hipóteses (criação de novos
conceitos).
A partir desses fatores, pode-se chegar a novos conhecimentos, a novos conceitos
ou uma nova apresentação, possivelmente construída pela platéia a partir do
que viu ou ouviu. A ressalva é que o “apresentador”, na hora do show, tenha
uma certa empatia com seu público, interpretando com naturalidade o que ele
sente ou pensa no momento da comunicação de qualquer tema, já que não se
trata de simples informação, mas de uma relação de conhecimento, específico
ao contexto – nesse caso, ao momento da apresentação.
Como conseguir isso? Com simplicidade, sem ensaiar falas e atos, deixando o
pensamento fluir com liberdade. O conhecimento, pois, vem naturalmente,
emergindo e submergindo na mente de cada um. Talvez assim o PowerPoint deixe de
ter o status de um brinquedo sofisticado e seja mais bem utilizado.[Webinsider]
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