Parisienses cultivam moda de passear em bueiros
 


Paris é famosa pela beleza de suas ruas - mas muita gente prefere aproveitar o que há por baixo dos famosos monumentos da Cidade-Luz. São pessoas que, em seu tempo livre, abrem tampas de bueiros e entram nas famosas catacumbas de Paris, uma rede de 300 quilômetros de túneis subterrâneos onde, apesar de uma proibição formal, são organizadas festas e outras atividades literalmente underground .

Caminhar pelos túneis fora do circuito oficial, que mostra apenas uma ínfima parte deles, pode render uma multa de 60 euros (R$ 216). Mesmo assim, a popularidade é tanta que, recentemente, a polícia descobriu até mesmo um cinema e um restaurante nas catacumbas. Ambos foram imediatamente desativados.

Pedreira
A parte da Paris subterrânea que é oficialmente aberta ao público pode ser acessada pelo Museu das Catacumbas. Os subsolos da capital francesa foram durante séculos uma pedreira da qual se extraíram as pedras usadas para construir o Museu do Louvre, a Catedral de Notre Dame e boa parte dos prédios de Paris.

Para entrar nesse labirinto de túneis, é preciso ir com alguém que freqüente o local - um dos chamados catafilos. Mapas, lanternas e outros equipamentos semelhantes aos dos espeleólogos também são necessários. Trata-se de uma verdadeira expedição.

Como o circuito não é oficial, as entradas não são de fácil acesso: tampas de bueiros ou buracos no chão. Existem no subsolo inúmeras "salas" que os catafilos utilizam para se encontrar. Há, por exemplo, a Sala do Castelo, onde um operário das catacumbas esculpiu um castelo na pedra. Em uma outra há esculturas de arte contemporânea.

Água
A mais recente é a sala "Sarkô", cuja forma parece a de um sarcófago e que faz alusão ao ministro francês da Economia, Nicolas Sarkozy. A temperatura nas catacumbas é constante durante o ano todo, de 10º C a 12º C. Em muitos trechos, é preciso caminhar curvado em razão da pouca altura dos túneis.

A água também é um elemento constante do trajeto e muitas vezes caminha-se com água até a altura das coxas. Normalmente, apenas os fiscais que controlam a solidez da estrutura subterrânea de Paris podem percorrer essas galerias. Qualquer outra visita é ilegal.

Mas, em qualquer caminhada, é possível encontrar inúmeras pessoas. O clima é bastante cordial e, diferentemente do que acontece na superfície, as pessoas se cumprimentam, muitas vezes de maneira efusiva, mesmo sem se conhecerem.

Apelido
Os catafilos têm uma regra: dão nomes que nunca se sabe se são verdadeiros ou usam normalmente apelidos, como a garota que afirmou se chamar "Assedic", o nome do seguro desemprego na França.

O francês com apelido de "Mega" começou a passear pelas catacumbas há 15 anos. Depois de um período sem visitá-las, ele voltou a freqüentar o subsolo de Paris, que conhece bem. "Há pessoas que preferem ir à discoteca no sábado à noite. Eu prefiro vir às catacumbas", diz ele, que utiliza um equipamento profissional para percorrer as galerias.

"Ter interesse por essa antiga pedreira gigante é querer conhecer cada vez mais a história de Paris", afirma Mega. Esse aspecto histórico interessa muitos freqüentadores, mas outros vão ao local apenas para fazer festa.

É o caso da francesa Alexandra, que disse ter caminhado nas catacumbas durante toda a noite e que visitava o local pela primeira vez por curiosidade. "São emoções diversas. No começo, vamos descobrindo as catacumbas. Às vezes, ficamos perdidos. O medo principal aqui é esse. Só pensamos em não nos perdermos", diz ela.

Caminho errado
Mesmo as pessoas que já foram inúmeras vezes às catacumbas acabam errando o caminho. São apenas os freqüentadores mais antigos que conseguem obter uma cópia do sofisticado mapa, conhecido como Gireau, nome da pessoa que conseguiu fotocopiar o mapa usado pelos fiscais que inspecionam regularmente a segurança do subsolo de Paris.

E, mesmo assim, precisam abri-lo inúmeras vezes durante o trajeto. Sob a terra, há também placas das ruas, mas muitas delas já não têm mais o mesmo nome. O caminho é cheio de desvios e não representa o mesmo trajeto da superfície.

Os fiscais muitas vezes acabam construindo muros para dificultar o acesso dos catafilos, fazendo com que as distâncias fiquem bem mais longas.

A visita não-oficial às catacumbas exige bom senso de direção e vigor físico. Para quem prefere menos cansaço e menos risco, o Museu das Catacumbas continua sendo uma opção.
 BBC Brasil

 

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