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Google Accelerator é
bom, mas traz questões
Imagine seu site de notícias pessoais com a mesma capacidade de visitas do
New York Times. Tudo isso pode estar perto de ser realidade, com um único porém:
a internet não será mais a internet, será apenas o Google.
Gustavo Mansur
Bem aventurados os puros, porque deles será o reino dos céus. Já o reino da
internet, da forma como caminham as coisas, será do Google. O que já é muito
mais do que um simples buscador está decidido a se colocar no centro da rede,
como mostra sua última, original e muito ambiciosa aposta: o Google
Accelerator. Se eles conseguirem o objetivo, se uma parte significativa dos
internautas o adotar e os browsers o incluírem, a rede mudará para sempre. O
Google será seu coração.
Quando você aponta um endereço na internet, está enviando uma pequena
mensagem para um computador remoto. Seu pedido percorre incontáveis quilômetros
de cabos e passa por dezenas de computadores antes de chegar a seu destino: o
servidor da página web que o recebe e responde.
A resposta deste servidor, outra pequena mensagem, percorre de novo incontáveis
quilômetros, mais uma dezena de computadores antes de chegar a você, onde se
transforma na página web que você pediu para ver. Este processo dura muito
pouco, normalmente microssegundos. Os cabos e os computadores no meio do caminho
pertencem a diferentes empresas e instituições, logo este processo vital para
a web não é controlado por ninguém.
Não era. Agora o Google quer mudar tudo com este novo produto, atualmente em
fase de testes e ainda não disponível. O Google Accelerator é a mais radical
remodelação da web já planejada desde a sua criação. Seguindo a estratégia
de se fazer da rede um gigantesco computador administrado por eles (o Google
Desktop), o Google oferece um pacto faustiano: navegar mais depressa,
especialmente para quem usa conexões de banda larga, em troca entregar a eles o
controle real da internet.
A idéia central do Accelerator é de enviar todos os pedidos feitos por quem se
inscrever no serviço através dos computadores do Google. Quando você
solicitar uma página web, este pedido irá direto para o Google que responderá
com uma página previamente armazenada em suas máquinas, comprimindo a informação,
pré-armazenando páginas em seu próprio servidor.
Desde seu lançamento no início do mês de maio, já surgiram as primeiras críticas
ao projeto. Fala-se de uma séria ameaça a privacidade e a liberdade da web.
Também falam de problemas de identificação e do risco que o serviço do
Google possa criar um empecilho para o comércio na rede assim como para todo o
tipo de serviço que exige pronta resposta de aplicações online.
Do lado positivo o Accelerator não só tornará a navegação mais rápida como
também pode tornar mais fácil driblar a censura a vários tipos de páginas na
web que alguns países ainda impõe a seus habitantes.
Porém tudo isso é um mero detalhe quando comparado ao verdadeiro significado
da idéia: uma radical reorganização da rede. Se o uso do Accelerator atingir
uma grande parcela, cada vez mais o tráfego da internet deixará de percorrer
as entranhas da rede para se tornar exclusivo das máquinas do Google. Os
efeitos são difíceis de se imaginar, porém certamente serão cataclísmicos,
principalmente para os criadores de conteúdo na internet.
Mesmo sendo difícil prever todos os impactos do projeto do Google vamos tentar
imaginar dois efeitos imediatos. Para a publicidade online o Accelerator pode
destruir os sistemas de medição de tráfego sobre o qual se baseia toda a
propaganda feita na rede.
Mais impactante seria o fim de um dos mais sérios desafios que a internet
oferece para muitos meios de comunicação online: o fato de que quando maior o
número de leitores, maior é o custo do serviço. O efeito se deve ao fato de
que os custos de banda crescem proporcionalmente com o número de leitores. Não
são raros os casos de criadores de conteúdos online que foram à falência
devido ao sucesso de público de seus serviços.
Este dilema tem feito com que só empresas tradicionais e com grande respaldo
econômico consigam criar grandes serviços de conteúdo online e replicam na
comunicação online o mesmo modelo já instalado em jornais e revistas mundo
afora: a comunicação de grandes massas na rede continua nas mãos de grandes
corporações. Um blog 'independente' de sucesso só tem capacidade para um
grande público se estiver debaixo do teto de um grande provedor, normalmente
ligado a um grande grupo de mídia.
Se o Accelerator atingir seu objetivo, e até hoje o Google atingiu todos os que
propôs, já não haverá diferença entre ter dois leitores ou dois milhões.
Sob o ponto de vista técnico, só haverá um visitante importante na sua página
web: o robô do Google, que atualizará a página nos arquivos do
Accelerator. A
internet será realmente nivelada para os produtores de conteúdo, e os pequenos
estarão um pouco mais próximos dos grandes. Os computadores domésticos não
precisarão mais continuar na corrida desesperada por mais potência de conexão.
A rede será dirigida para um só lugar, o Google.
O Google Desktop estará completo. A rede será um gigantesco computador que
alimentará todas as suas pontas. Nossos micros serão simples terminais
alimentados pelo Google. Os computadores serão mais baratos, as conexões mais
rápidas, o preço de banda cairá radicalmente, haverá mais fontes de informação
e todas serão iguais. Com o controle da rede o Google terá o poder de desafiar
uma Microsoft da vida.
Até agora o Google tem utilizado com sabedoria seu crescente poder. Sua
filosofia está voltada para o futuro imediato, muito mais do que qualquer
empresa existente hoje. Há poucas razões para se duvidar de seu compromisso
com a comunidade de internet, de sua vontade de fazer boas e práticas
ferramentas. O Google ainda não deu motivos para ser visto como o novo “Império
do Mal”, ou coisa do gênero. Até o momento suas intenções são boas.
Ao largo da história as concentrações de poder sempre se mostraram muito
tentadoras. O futuro que o Google nos oferece é atrativo, tem muitas vantagens,
é bom para todos, tirando alguns empecilhos como a publicidade e o comércio
online que certamente podem ter suas soluções.
O Accelerator ainda vive em fase beta. Que a infraestrutura do Google esteja no
centro da rede não é necessariamente ruim. O importante é que sempre existam
vias de escape. Nossas avós já diziam: "seguro morreu de velho". [Webinsider]
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