|
Site irá disponibilizar
coleção completa do "Pasquim"
GABRIELA LONGMAN
da Folha de S.Paulo
Enquanto revistas antigas são geralmente malconservadas e pouco
lidas nas bibliotecas e acervos, um jornalista/ historiador/webdesigner
passa as noites em claro para disponibilizar on-line e
gratuitamente edições de "O Cruzeiro", "Careta" e "O Malho"
--publicações que marcaram a história da imprensa no século 20.
Criador do site Memória Viva (www.memoriaviva.com.br)
há oito anos, Sandro Fortunato prepara uma nova empreitada: um
gigantesco banco de dados digital em que tudo o que já foi
escrito, citado e desenhado no "Pasquim" poderá ser localizado
por internautas.
Com a autorização de
Ziraldo, Ivan Cosenza (filho de Henfil), Luiz Carlos Maciel e
outros colaboradores do periódico, aos poucos Fortunato
transforma em arquivo digital a coleção completa do "Pasquim",
semanário editado entre 1969 e 1991 e famoso pela contestação à
ditadura militar.
A coleção foi doada em maio deste ano pelo mineiro Rogério
Gomes. Se Sandro mora em Brasília e a coleção estava em Juiz de
Fora (MG), não teve problema: pegou um ônibus e em menos de 24
horas trouxe para seu apartamento em Brasília cerca de 300
quilos de jornal --mais de mil exemplares.
"Cheguei à rodoviária com 16 sacos de lixo lotados. O motorista
me disse: 'Olha, você precisa transformar isso tudo em quatro
volumes. Dois deles você tem direito a levar, o menor eu vou te
cobrar, e o quarto eu finjo que não vi'."
Depois da "travessia", a coleção começa a chegar à internet na
semana que vem, no dia 4 de setembro, com os 50 primeiros
números digitalizados.
Carioca de 34 anos, Fortunato já viveu no Rio, em Natal, em
Brasília. Embora dedique a maior parte de seu tempo ao Memória
Viva, trabalha num portal particular para tirar seu sustento. "O
Memória Viva nunca teve patrocinador, não cobra por acessos",
diz o jornalista, cuja coleção tem cerca de 9.000 jornais e
revistas.
"O site surgiu da constatação de que a web brasileira, assim
como o próprio país, não costuma preservar sua memória."
No início, a página reunia biografias de personalidades da
história e da cultura do país. O trabalho com a imprensa só
começou em 2002. "Quando precisei de fotos de Juscelino
Kubitschek, tive a oportunidade de ter em mãos 40 edições da
revista "O Cruzeiro". Em pouco tempo estaria no ar um setor
voltado exclusivamente para a revista. Em 2005, o site foi
vencedor do Prêmio Ibest de Arte e Cultura e hoje recebe cerca
de 2.000 visitas diárias.
Direitos Autorais
Para disponibilizar "O Pasquim", Fortunato procurou os
colaboradores e pediu a liberação do material; mas e quanto à
revista "O Cruzeiro"?
"Até hoje existe briga na família do [Assis] Chateaubriand pela
fortuna dos "Diários Associados", da qual "O Cruzeiro" fazia
parte. Mas a coisa é ainda mais complicada: quando vou publicar
uma matéria, o direito é de quem escreveu ou do jornal que
publicou? Em relação às fotos, tem o direito do fotógrafo, do
veículo e de quem aparece. Ou você faz como eu fiz --vai
colocando no ar-- ou então não faz nunca."
Fortunato argumenta que seu trabalho é de interesse histórico e
sem fins lucrativos. "Se alguém se achar ofendido ou pedir para
não publicar algo, tiro do ar na hora", diz, fugindo da encrenca
judicial --nunca foi processado. "Em geral, acontece o
contrário: muitos fotógrafos da época entraram no site e ficaram
fascinados: "Puxa, obrigado, alguém prestou atenção e preservou
no nosso trabalho"."
"Bibliotecas" similares
Se ainda são muito raras iniciativas como as do Memória Viva,
pouco a pouco a internet começa a receber outros sites que
ajudam a mapear história do Brasil por meio de sua imprensa e de
suas publicações.
Um dos melhores exemplos é o site Rio Através dos Jornais (www2.uol.com.br/rionosjornais),
que percorre eventos da história do Rio de Janeiro, entre 1888 e
1969, contados na íntegra, pela ótica de 62 diferentes jornais
da época.
Recentemente o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e
Planejamento) colocou na rede a coleção de sua célebre revista
"Novos Estudos", publicação que marcou a história intelectual do
Brasil a partir de 1981.
Assim, no site do centro (www.cebrap.org.br)
é possível acessar artigos dos críticos Roberto Schwarz e
Antonio Candido, do sociólogo Francisco de Oliveira e dos
economistas Celso Furtado e Paul Singer, entre outros. A leitura
da íntegra dos textos, porém, só é permitida aos assinantes, ao
custo de R$ 45 anuais.
O Banco de Dados da Folha gerencia a página Almanaque (almanaque.folha.uol.com.br),
em que é possível acessar textos históricos do jornal e galerias
de fotos antigas, ordenadas por assunto.
|