Agricultor do asfalto


Hans Dieter Temp começou sozinho a plantar em terrenos baldios. Semeou idéias e agora coordena o projeto de agricultura urbana da maior cidade do país


Janice Kiss 

Se o Brasil depender de pessoas como Hans Dieter Temp, o país urbano há de se entrelaçar ao rural sem confrontos. Na visão desse gaúcho de 39 anos e inegável origem alemã, basta que as cidades grandes ou pequenas adotem a agricultura urbana como política pública recuperando áreas abandonadas através da produção de alimentos. Terrenos baldios ou beira de rios, por exemplo, podem hospedar legumes e verduras que saem da colheita direto para o prato. Com dinheiro do próprio bolso e utilizando os finais de semana, há dois anos Temp começou a cultivar hortaliças em áreas que haviam se transformado em depósitos de lixo no Jardim Laranjeiras, na zona leste de São Paulo. O experimento lhe rendeu reconhecimento e uma missão de grande envergadura. O funcionário da área de relações internacionais da prefeitura de São Paulo foi alçado à condição de coordenador de um programa de agricultura urbana, ligado à Secretaria do Meio Ambiente. Vai tentar difundir suas idéias pelos quatro cantos da metrópole mais caótica do país.

Num misto de conforto e desafio - afinal era estranho trabalhar com as mãos grossas e cheias de calo em meio às etiquetas diplomáticas - ele traça seus planos para implantar cultivos nos bairros mais carentes e em aldeias indígenas (elas existem na zona sul de São Paulo) que vivem à beira da miséria. "As hortas precisam atender a preferência alimentar de cada lugar. Se índio gosta de mandioca por que vamos oferecer batatas?", compara.

O respeito à tradição culinária que, em princípio pode parecer luxo, ajudou Hans a se aproximar mais dos moradores da zona leste nos primórdios de seu trabalho. Boa parte deles é de origem nordestina e, portanto, o plantio de coentro é tão essencial quanto à salada de alface com tomate. Ele tem noção do que é implantar um projeto que nasceu pequeno e necessita ser alargado para um município de 10 milhões de habitantes. Nesses momentos, faz uso da racionalidade alemã para não se afobar. Sabe que é preciso conhecer o tamanho da área disponível para depois utilizar os recursos da prefeitura, se associar a centros comunitários e escolas.

Sua experiência ensina que é preciso mobilizar as pessoas a tal ponto que elas se convertam em semeadores do mesmo ideal. "No começo não foi nada fácil", relembra Temp. Primeiro, foi preciso enfrentar a resistência de alguns proprietários nessa parceria que os beneficiava com a limpeza de uma área degradada em troca da concessão de uso. Logo depois, havia a desconfiança dos moradores que não acreditavam em nada no projeto. Até mesmo o cheiro da terra adubada os incomodava. Afinal, o que pretendia esse alemão de nome quase impronunciável? Plantar onde havia sujeira com a ajuda dos meninos do bairro? "Duvido", era a resposta mais freqüente e desalentadora para seus planos.

 

 

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