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Japoneses criam pele robótica
que pode sentir calor e pressão
RICARDO BONALUME NETO
da Folha de S.Paulo
A ficção científica americana --na forma de livros ou de filmes-- é
fascinada por robôs, mas na prática são japoneses os que mais usam esses
auxiliares automatizados do ser humano --seja na indústria, seja em residências.
Uma nova pesquisa japonesa, no entanto, promete juntar as duas coisas no futuro.
A Universidade de Tóquio desenvolveu uma pele artificial para robôs que imita
uma parcela significativa das qualidades e capacidades da pele humana normal.
A curto e médio prazo, abrem-se várias possibilidades de aplicações práticas.
A longo, longuíssimo prazo, poderá surgir uma pele biônica, que poderia tanto
ser aplicada a robôs com formas humanas quanto ser utilizada em pessoas de
verdade.
E com um detalhe holywoodiano: a pele-robô futura poderá ir além da sua
concorrente biológica, sendo capaz de detectar melhor várias coisas, ou mesmo
realizando truques que nenhuma pessoa é capaz de fazer hoje --perceber radiações
diferentes da luz visível, nuanças muito sutis de tato e de temperatura ou
mesmo som. Seria uma espécie de superpoder biônico.
Além do tato
A equipe de Takao Someya já havia, no ano passado, anunciado o desenvolvimento
de uma pele artificial capaz de sentir diferenças de pressão --ou seja, uma
forma de tato. Mas seria preciso ir além, pois o tato dá outras informações
ao organismo, como a temperatura dos objetos tocados.
Além disso, a pele é extremamente maleável, adaptando-se muito bem aos
movimentos do corpo. O ideal para uma pele artificial seria ser "conformal",
segundo o jargão da engenharia --isto é, ela deveria ser capaz de se adequar
de modo maleável à forma requisitada.
Os pesquisadores da Universidade de Tóquio não querem fazer ficção científica.
A pesquisa busca aplicações práticas da tecnologia. O Japão é o líder
mundial quase inconteste em robótica. No ano passado, existiam 352,2 mil robôs
industriais no Japão, contra 121,3 mil nos EUA e 266,1 mil nos países da União
Européia, o chega a um total de quase 1 milhão em todo os países do mundo.
Da ficção à pesquisa
A palavra robô, com o sentido empregado pelas pessoas hoje, surgiu em uma peça
de 1920 do dramaturgo checo Karel Capek (1890-1938). O termo foi muito
popularizado na ficção graças ao livro "Eu, Robô" (1950), do
escritor americano nascido na Rússia Isaac Asimov (1920-1992).
A mais nova versão cinematográfica do filme tem o ator Will Smith no papel
principal. Smith tem um braço-robô com uma cobertura de pele artificial que
pode ser reposta com um spray. A tecnologia de Someya e colegas ainda está bem
longe disso. Mas está caminhando a passos largos.
Eles usaram um fino filme plástico como base para uma série de circuitos eletrônicos
baseados em estruturas de material orgânico. E desta vez foram além do que
havia sido reportado no ano passado --além de pressão, os semicondutores orgânicos
puderam detectar temperatura com precisão.
Flexibilidade
A pele vem na forma de uma rede flexível, capaz de "conformabilidade",
adaptando-se, por exemplo, à superfície de um ovo. Ainda está bem longe da
capacidade da pele humana. Um dos protótipos iniciais continha uma rede de 16
sensores de pressão por centímetros quadrado. Já a ponta dos dedos de um ser
humano possui cerca de 1.500 sensores de pressão (menos em outros pontos do
corpo, contudo).
Mas um robô industrial não precisaria de tanta precisão para suas atividades
rotineiras. A pele-robô pode ter usos muito variados. Nem precisaria estar em
um robô. Pode ser uma espécie de tapete sensível, por exemplo.
O trabalho de Someya e seus colegas está publicado na última edição da
revista da Academia de Ciências dos EUA, a "PNAS" (www.pnas.org).
Segundo eles, a pele humana ainda é bem mais complexa do que as imitações
desenvolvidas até agora.
Mas, escreveram eles no artigo hoje divulgado, "vai ser possível no futuro
próximo fazer uma pele eletrônica que tenha funções que a pele humana não
tem ao integrar vários sensores, não apenas para pressão e temperatura, mas
também para luz, umidade, esforço e ultrassônicos".
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