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"Supercomputador" da
Receita vai caçar sonegador
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FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
da Folha de S.Paulo
O T-Rex, um supercomputador montado nos Estados Unidos que leva o nome
do devastador Tiranossauro Rex, e o software Harpia, desenvolvido por
engenheiros do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e da Unicamp e
batizado com o nome da ave de rapina mais poderosa do país, são as mais
novas armas da Receita Federal do Brasil para combater a sonegação
fiscal e elevar a arrecadação. E os primeiros alvos já estão definidos:
empresas brasileiras que importam e exportam.
A partir de janeiro de 2006, a Receita coloca em operação um equipamento
capaz de cruzar informações --com rapidez e precisão-- de um número de
contribuintes equivalente ao do Brasil, dos EUA e da Alemanha juntos.
O projeto de aquisição e instalação do T-Rex, fabricado pela IBM e que
pesa aproximadamente uma tonelada, levou seis meses. Está instalado no
Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), em São Paulo, desde
o último dia 12 de setembro.
O novo software, em desenvolvimento desde fevereiro deste ano por
pesquisadores dos dois centros paulistas de tecnologia, vai permitir
que, a partir de uma técnica de inteligência artificial (combinação e
análise de informações de contribuintes), sejam identificadas as
operações de baixo e alto riscos para o fisco --isto é, se há ou não
indícios de fraude.
Esse programa de computador faz parte do projeto Harpia, que vai
integrar e sistematizar as bases de dados da Receita, além de receber
informações de outras fontes, como secretarias estaduais da Fazenda, e
de investigações já realizadas, como a CPI do Banestado.
Informação em segundos
"Com esse computador e software, a Receita terá uma análise do
contribuinte em segundos. Processos de empresas que levam até um ano
para ser analisados poderão ser concluídos em uma semana", afirma Paulo
Ricardo de Souza Cardoso, secretário-adjunto da Receita, responsável
pela área de fiscalização, tecnologia e administração tributária.
Na primeira fase, o supercomputador e o novo software cuidarão da área
aduaneira. O setor de comércio externo foi escolhido por causa do
aumento dos negócios entre o Brasil e o exterior, do peso das
exportações e das importações na economia e do grande número de fraudes
envolvendo o comércio internacional.
"O Brasil utiliza automação desde 1996 nas exportações e desde 1997 nas
importações para inspecionar as operações. Mas a Receita entende ser
imprescindível agregar mecanismos de análise de riscos a esse modelo.
Pode-se dizer que, em oito anos, a rotina automática de seleção não
sofria alteração substancial, permanecendo baseada na natureza da
operação registrada --e não no nível de risco identificado. Agora, vamos
nos antecipar a qualquer tipo de fraude que venha a ocorrer."
Carlos Henrique Costa Ribeiro, chefe do Departamento de Teoria da
Computação do ITA, que coordena uma equipe de 20 técnicos que trabalham
na elaboração do software, diz que a novidade do sistema é a capacidade
que ele terá de aprender com o "comportamento" dos contribuintes para
detectar irregularidades.
"A partir de informações de várias fontes, o sistema vai analisar os
relacionamentos das empresas, tanto com pessoas físicas (como um
advogado) como com jurídicas. Terá condição de identificar se o
contribuinte negocia com 'laranjas' ou empresas 'fantasmas'", afirma o
pesquisador do ITA.
O novo banco de dados da Receita vai armazenar informações sobre as
empresas e seus negócios, como tributos recolhidos por ela e seus
sócios, exportações e importações realizadas, ocorrências de falhas nas
operações de compra e venda no mercado externo e até se há envolvimento
com atividades ilícitas, como contrabando de armas e narcotráfico. Esses
dados vão compor um histórico de cada contribuinte.
Cardoso informa que todo o arsenal tecnológico será utilizado para
combater diversos crimes --lavagem de dinheiro, tráfico de drogas,
contrabando de armas e uso de "fantasmas" para importar ou exportar.
"É preciso ter um controle estrito sobre os fluxos cambiais. As
infrações, como lavagem de dinheiro, acabam funcionando como uma espécie
de incentivo a atividades criminosas, devendo ser rigorosamente
combatidas."
A Receita quer evitar, segundo Cardoso, que as empresas tragam dinheiro
"sujo" para a economia, com operações super ou subfaturadas no mercado
externo.
Casos como o da exportação fictícia de açúcar e de derivados de soja,
que causaram rombo de cerca de R$ 2 bilhões aos cofres públicos, como
revelou a Folha, e o da Daslu, maior loja de artigos de luxo do país,
suspeita de subfaturar importações, poderiam ser detectados por esse
novo sistema, segundo a Folha apurou com técnicos da Receita em São
Paulo.
Novos alvos
A Receita já faz cruzamento de dados, mas ainda não dispunha de um
serviço "inteligente" de análise de risco de cada contribuinte. Em uma
segunda etapa do projeto, a nova tecnologia será estendida a todas as
pessoas físicas e jurídicas --e não só às que operam no comércio
internacional.
Serão analisadas as informações sobre a capacidade econômica das pessoas
--rendimento, movimentação financeira, gastos com cartão de crédito e
aquisição de bens, como imóveis, carros, aeronaves e barcos-- e das
empresas. Essa análise não será isolada em um determinado ano fiscal
--vai considerar o histórico de informações de cada contribuinte.
"Dessa forma, será possível acompanhar de perto setores que apresentam
problemas, como bebidas, cigarros e combustíveis [considerados campeões
de sonegação]. Se a carga tributária de um determinado setor não for
compatível com a arrecadação estimada, será possível identificar quais
empresas estão com 'desvio de conduta'. E a fiscalização, nesse caso,
será acionada", afirma o secretário-adjunto da Receita.
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