A era da internet social

A vida de qualquer pessoa que usa a internet é marcada por momentos reveladores, daqueles que levam a pensar: "Como é que eu pude viver tanto tempo sem isso?" Entre eles certamente estão o primeiro e-mail recebido, a primeira pesquisa que trouxe resposta a alguma pergunta e o primeiro acesso por uma conexão sem fio. Prepare-se, então, para incluir mais um item na lista: a primeira espiada no Orkut.

Quando os primeiros grandes sites de relacionamento começaram a ganhar destaque, três anos atrás, eram vistos como mera curiosidade, uma brincadeira de adolescentes com tempo de mais e preocupações de menos. Não mais. Hoje, redes sociais como Orkut, MySpace e Facebook são apontadas como as mais importantes novidades a surgir na rede desde as mágicas buscas do Google.

 O Facebook, lançado em 2004 num dormitório de Harvard por um jovem que mal havia completado 20 anos, conta com uns 55 milhões de usuários -- hoje. Amanhã (literalmente), outros 250 000 terão se cadastrado no site. Daqui a uma semana, mais de 1,5 milhão. O ritmo tem se mantido nesses níveis desde o início do ano, e não há sinais de que vá diminuir tão cedo.

Por uma ínfima parte desse negócio, mais precisamente 1,6% das ações, a Microsoft pagou 240 milhões de dólares, o que levou o valor da empresa de Mark Zuckerberg a incríveis 15 bilhões de dólares. Pode ter sido um exagero, uma vez que as receitas do Facebook não devem passar de 100 milhões de dólares neste ano. Mas o prejuízo, se vier, certamente será pequeno diante do potencial transformador das redes sociais.

Para os mais velhos -- entre os quais muitos de nós --, entrar na web costuma ser uma atividade essencialmente individual, seja para consultar o e-mail, ler as últimas notícias, seja para fazer uma pesquisa relacionada ao trabalho. Para a nova geração, a web é tudo isso e muito mais. É onde a vida acontece. É nas redes sociais que os mais jovens -- mas não somente eles -- se mantêm em contato permanente.

São pessoas reais, com nome, sobrenome e rosto conhecidos, e isso não significa somente um novo sentido para o termo privacidade. Na maioria das vezes, essas conexões existem entre pessoas que já se encontram regularmente no "mundo real". Para uma parcela cada vez maior dos mais de 1,2 bilhão de pessoas conectadas à internet, as redes sociais são um repositório fiel de suas memórias, seus desejos e suas afinidades.

 E, como está cada vez mais claro na cacofonia da internet, são essas relações sociais transportadas para a web que vão ser o principal filtro para a vida online.

"As redes serão cada vez mais a porta de entrada para a web", disse a EXAME Chris DeWolfe, criador do maior de todos os sites de relacionamento, o MySpace. Mas talvez seja mais que isso. Os americanos passam 12% do seu tempo online navegando pelas páginas do MySpace.

Dentro do próprio site eles podem ouvir músicas, ler blogs, trocar mensagens, assistir a trailers de filmes e trechos de programas de TV, participar de debates com políticos e ler notícias. Muita gente achou loucura a News Corp., do magnata australiano Rupert Murdoch, pagar 580 milhões de dólares pela empresa. Hoje, ele é considerado um visionário. "Os hábitos dos telespectadores mudaram muito nos últimos anos, como você sabe.

E os responsáveis são os consumidores", diz DeWolfe. "Eles querem ver filmes e ouvir música quando quiserem, na forma que quiserem, onde quiserem. As empresas de mídia não têm escolha: elas têm de atender às demandas dos consumidores."

E NÃO SÃO APENAS AS EMPRESAS de conteúdo que terão de se adaptar à revolução da internet social. O mundo da publicidade olha com atenção para mais uma ruptura. Além da fragmentação da audiência, agora as mensagens comerciais serão cada vez mais transmitidas pelos próprios consumidores para suas redes de amigos -- voluntariamente.

Essa é a premissa de um novo sistema de publicidade dentro do Facebook, anunciado há um mês e todo ele baseado no poder do boca-a-boca que corre pelos sites de relacionamento. "Nos últimos 100 anos, a maneira de fazer publicidade era chegar às mídias de massa, empurrando seu conteúdo", disse o dono do Facebook, Mark Zuckerberg, no lançamento de seu novo sistema de publicidade. "Mas esse foi o século passado.

 Nos próximos 100 anos, a informação vai ser compartilhada entre as milhões de conexões sociais das pessoas. Vocês (publicitários) precisarão fazer parte dessas conexões." Descontados os delírios de grandeza -- ou a falta de modéstia -- de Zuckerberg, as palavras foram ouvidas com atenção por anunciantes de todo o mundo.

Elas também ecoaram em Mountain View, a sede do Google, empresa que faturou 15 bilhões de dólares nos últimos 12 meses exclusivamente com a venda de pequenos anúncios atrelados às buscas dos internautas. Apesar da dominância absoluta no Brasil, o Orkut não tem expressividade nos maiores mercados do mundo e não rende um centavo sequer em receita para o Google, pelo menos por enquanto.

Além do desafio de rentabilizar o negócio da rede social, há outra questão: qual é o risco de o Google não ter nas mãos as informações detalhadas sobre o perfil e os hábitos dos usuários de redes sociais? A empresa disse repetidas vezes que sua prioridade é melhorar a experiência do usuário no Orkut, e só depois rentabilizar o serviço. Mas há outro desafio: como as interações e as recomendações, que são o sangue das redes sociais, terão impacto no negócio principal da empresa, que é justamente fazer esse trabalho com máquinas?

 Até quando os algoritmos do Google serão mais eficientes do que um ser humano -- mais que isso, uma pessoa de confiança -- na hora de apontar as melhores respostas para uma pesquisa? Ainda é cedo para responder, mas tenha uma certeza: a revolução da internet social está apenas começando.

Sérgio Teixeira Jr. / Revista Exame

 

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