Os custos da tecnologia digital e da
infra-estrutura da internet tendem a
zero - e os serviços do mundo online,
também.
É possível entregar produtos e
serviços de graça e ainda assim ganhar
dinheiro? Pelo menos no mundo online, a
resposta é sim, e a economia do grátis é
uma tendência inevitável, de acordo com
uma idéia levantada por Chris Anderson,
editor da revista Wired. Anderson, que
deve publicar um livro sobre o tema no
segundo semestre de 2008, argumenta que
muitos dos custos ligados à tecnologia
da informação -- sejam eles de
armazenamento, de processamento ou de
telecomunicações -- estão caindo de
forma vertiginosa e tendem a zero. "O
custo de guardar ou transmitir 1
kilobyte de dados é tão baixo que nem é
mais medido. Em pouco tempo, o mesmo vai
ser verdade para 1 megabyte e, no
momento seguinte, para 1 terabyte",
escreveu ele num artigo recentemente
publicado na revista inglesa The
Economist. Esse movimento formidável de
aumento de capacidade com redução de
custos -- expresso de forma definitiva
na Lei de Moore, que afirma que a cada
18 meses dobra o poder de computação dos
microchips e os preços caem pela metade
-- já tem impacto claro em algumas
indústrias, como a da música. Outro caso
clássico é o Google, empresa que deve
passar dos 15 bilhões de dólares de
faturamento neste ano oferecendo a
imensa maioria de seus serviços de
graça. Mas existem efeitos não tão
óbvios assim. A indústria da televisão,
por exemplo, tem de se transformar por
causa da emergência de serviços como o
YouTube, que se aproveita dos custos
decrescentes de infra-estrutura
tecnológica para oferecer uma coleção
virtualmente infinita de vídeos, com a
comodidade de se assistir somente o
desejado, na hora mais conveniente. De
uma maneira ou de outra, argumenta
Anderson, todos os negócios tocados pela
internet -- e eles são muitos -- vão ser
influenciados pela economia do grátis.
Muitos dos inúmeros serviços
gratuitos oferecidos na internet são
pagos com o dinheiro dos anunciantes.
Esse modelo de negócios, que
tradicionalmente se aplicou à TV aberta
e ao rádio, está se expandindo. No
negócio da música, a equação é um pouco
diferente: o dinheiro vem cada vez mais
das performances ao vivo e menos da
venda de discos. Mas a distribuição
gratuita de faixas é essencial para
angariar fãs e, conseqüentemente, fazer
boas turnês. Em outubro, a banda de rock
inglesa Radiohead ganhou as manchetes ao
lançar um disco pela internet.
Supostamente cansados da "exploração
injusta" das gravadoras, eles decidiram
cortar o intermediário e oferecer suas
músicas num site. Os fãs poderiam pagar
quanto quisessem pelo disco -- ou
simplesmente baixá-lo de graça
(pesquisas posteriores indicaram que
somente 40% dos fãs fizeram uma
contribuição, de 6 dólares em média).
"Hoje, ganhamos dinheiro principalmente
fazendo shows", disse Thom Yorke, o
líder da banda, numa entrevista recente.
O negócio das gravadoras, que sempre se
baseou na venda de gravações e na
distribuição de produtos físicos, pode
estar diante da maior crise de sua
história. Mas, para os músicos, a doação
de suas criações e até mesmo a
disseminação de suas músicas por meio da
pirataria passaram a ser parte integral
da viabilidade econômica.
A abundância da tecnologia digital
também está por trás de um dos modelos
de negócios mais inovadores dos últimos
tempos, o das empresas aéreas de baixo
custo. Graças a novos e modernos
sistemas de informação, as mais
agressivas empresas aéreas européias
podem cobrar menos de 10 dólares por uma
passagem dentro do continente. É
evidente que uma viagem custa muito mais
caro que isso, e os custos são cobertos
com a venda de uma série de outros
serviços, como refeições nos vôos,
manuseio de bagagem e diversos itens
relacionados a viagens, como aluguel de
carros e diárias de hotéis. E, é claro,
essas empresas também têm vantagens
econômicas ao planejar suas rotas sempre
envolvendo aeroportos secundários, que
oferecem taxas de operação muito mais
baixas que as dos grandes centros. Ao
redefinir o negócio da aviação em torno
do transporte aéreo "quase gratuito", em
vez de simplesmente vender passagens,
essas empresas mudaram para sempre o
setor -- e ganharam muito dinheiro com
isso. A maior delas, a irlandesa RyanAir,
faturou 3,2 bilhões de dólares no ano
fiscal de 2007, um crescimento de 32% em
relação ao período anterior, e os lucros
aumentaram 42%, atingindo 626 milhões de
dólares. As operadoras de telefonia
celular adotam um modelo de negócios
semelhante ao oferecer aparelhos cada
vez mais sofisticados de graça em troca
de contratos de longa duração e da
garantia de receitas com os serviços. É
claro que não existe quase nada
efetivamente de graça na vida, incluídos
aí os proverbiais almoços grátis que
ficaram célebres nas declarações do
Nobel de Economia Milton Friedman. Mas a
economia do grátis deve prosperar como
nunca em 2008.