O futuro da Internet na
Medicina
Renato Sabbatini
A Internet e a Web estão tendo um louvável efeito de aumentar a
consciência da comunidade médica sobre o valor do acesso à informação, da
educação continuada, e da mudança radical de paradigmas que a presença
universal desta grande rede está trazendo a todos os aspectos da sociedade,
inclusive na área da saúde.
Nos últimos meses tem
ocorrido uma verdadeira explosão no número de sites médicos e de saúde na
Web, e nas ferramentas novas que têm sido colocadas à disposição do médico.
Crescentemente, essas aplicações, que antes se dedicavam a facilitar o mero
acesso à informação científica, agora começa a se voltar para a documentação
clínica, para o processo de diagnóstico, terapia, transmissão de imagens,
de comunicação entre profissionais e destes com os pacientes, e assim por
diante.
Essa grande expansão está
sendo financiada por um novo modelo econômico na Internet, que é o
investimento maciço realizado por capitalistas de risco nas novas empresas da
era do comércio eletrônico ("e-business"), em franca valorização
nos mercados financeiros. Com isso, os gestores tecnológicos e os próprios médicos
estão obtendo recursos nunca obtidos antes, para realizar seus mais caros
sonhos.
Um desses sonhos é o prontuário
médico, aquela pasta que contém todo o histórico médico de um paciente. No
futuro, ele será baseado na Web, ou seja, as informações, inclusive
imagens, serão armazenados e visualizados em formato multimídia. Isso
efetivamente centralizará o prontuário médico em um único lugar da rede, e
permitirá que profissionais de saúde e o próprio paciente possam acessá-lo
de qualquer ponto do mundo, bastando saber o endereço e ter uma senha para
acessar a informação confidencial.
Esse prontuário não será
um simples repositório de dados: ele terá também funções
"inteligentes", que automaticamente analisarão os problemas de saúde
e prevenção do paciente e emitirão alertas e avisos, por exemplo, quando o
paciente esqueceu de fazer seu check-up anual, ou avisando o médico que ele
está com o peso acima do ideal. Outra aplicação diz respeito à terapia
medicamentosa. O médico contará com um "assistente de prescrição",
que dará acesso a uma imensa base de dados on-line de medicamentos, que poderá
calcular automaticamente dosagens e registrar o perfil medicamentoso do
paciente, obtendo uma análise das potenciais interações entre eles cada vez
que receitar um novo remédio. Essa função de estará disponível também
para o paciente através da Web, de modo que ele possa exercer automedicação
responsável, ou seja, quando for tomar um medicamento aparentemente
inofensivo, como uma simples aspirina, que no entanto pode causar sérios
problemas de saúde, ao potencializar a ação de outros medicamentos ativos,
como anticoagulantes.
Já existem softwares também
que enviam um e-mail automaticamente ao paciente todos os dias, lembrando o
paciente de tomar o medicamento receitado. Através de links colocados no
e-mail, o paciente pode ter acesso a artigos personalizados sobre o seu
problema de saúde, explicando os males de não se medicar, etc. Poderá também
facilitar a comunicação médico-paciente, permitindo que o paciente faça
perguntas ou dialogue com seu médico através da Internet, reforçando a
sensação de que está sendo acompanhado e a obrigação de assumir a
responsabilidade pelo seu próprio bem-estar.
Para o consultório médico
existirão também muitas aplicações interessantes: uma delas permitirá que
o paciente tenha acesso à agenda do médico e ele mesmo faça a marcação no
dia e na hora que mais lhe aprouver. Em outra, o paciente poderá acessar os
resultados de exames que ele tenha realizado durante a consulta ou em serviços
especializados. O Laboratório Fleury, de São Paulo, por exemplo, já presta
este tipo de serviço ao paciente, evitando que ele perca tempo e dinheiro ao
ter que voltar para pegar os resultados do exame. Os resultados são colocados
no site do Laboratório, e podem ser impressos pelo paciente em casa, se o médico
que o atendeu não tiver acesso à Internet.
Finalmente, por sua
portabilidade e possibilidade de conexão por rádio à Internet, os
computadores médicos do futuro serão muito provavelmente os "palmtops"
(computadores que cabem na palma de mão), ou PDAs (Personal Digital
Assistants). O PDA mais vendido do mundo é o Palm Pilot, da empresa americana
3Com: mais de 3 milhões de unidades vendidas em todo o mundo. Existem
diversos aplicativos médicos disponíveis na Internet para ele, que vão
desde programas simples de cálculo de parâmetros médicos, até o
armazenamento do prontuário eletrônico dos pacientes. O armazenamento de
livros eletrônicos e bases de dados de referência médica também é uma
aplicação interessante. No meu Palm V, por exemplo, tenho uma base de dados
sobre 5.000 medicamentos, que ocupa apenas 350 Kbytes, e que pode ser
consultada com uma facilidade incrível. Existem até livrarias on-line, como
a Barnes & Noble, que vendem livros para o Palm que podem ser
descarregados pela Internet.
A grande revolução que
ocorrerá dentro de 1 a 2 anos será que os PDAs, assim como os telefones
celulares e os pagers estarão conectados continuamente à Internet através
de ondas de rádio ('wireless'), e permitindo assim a navegação em qualquer
lugar, para leitura do seu e-mail, localização de informação na Web,
consulta a base de dados bibliográficos em rede, e muitas outras coisas mais,
que atualmente são feitas apenas através de computadores maiores. Essa nova
filosofia de computação atingirá em cheio a medicina dentro de 3 a 4 anos,
e provocará um grande impacto, devido à facilidade de uso, ubiqüidade e
baixo. O modelo Pilot Palm VII já oferece essa conexão por rádio, e o Palm
VIII oferecerá tela colorida e um programa para navegar na Web. A facilidade
de instalação e a grande mobilidade proporcionada por esses aparelhinhos
certamente os tornarão grande favoritos entre os médicos, ao caber no bolso
da camisa e concentrar enorme "poder de fogo" quanto ao acesso rápido
e descomplicado à informação e à interação no espaço virtual.
A convergência digital entre
fax, TV, rádio, telefone e Internet é a próxima onda tecnológica, depois
dessas ondas separadas, que começaram no final do século XIX. O aparecimento
de um veículo único para todos os tipos de informação, interativas e não
interativas, está prestes a acontecer. A área médica inevitavelmente também
sentirá o seu poderoso impacto.
Renato M.E. Sabbatini
é professor e diretor associado do Núcleo
de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista
de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo.
Email: sabbatin@nib.unicamp.br
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