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Diabete: Velha luta, novo
ataque
O lançamento da Lantus,
a primeira insulina com
ação 24 horas, dá fôlego ao combate contra a doença.
E mais novidades vêm por aí
Juliane Zaché
A diabete é uma doença traiçoeira.
Na maioria dos casos, os sintomas surgem aos poucos. Boca seca, sede
em excesso, vontade frequente de
urinar e cansaço. Com o tempo, ela
mina as forças do organismo e compromete a qualidade de vida.
Podem ocorrer complicações que levam ao infarto, insuficiência renal,
cegueira
e até a morte. No Brasil, calcula-se que dez milhões de pessoas sejam vítimas
do problema. No mundo, o número
chega a 150 milhões.
A diabete é caracterizada pela
incapacidade de o organismo aproveitar
a glicose (açúcar) proveniente dos alimentos e a existente no próprio corpo.
Isso acontece por falta ou dificuldade na produção ou absorção
da insulina, hormônio fabricado pelo pâncreas com a função de abrir as
portas das células para a entrada da glicose. Chamada de combustível das
células – é ela que fornece a energia para que essas estruturas funcionem
–, a glicose pode ser tóxica se alcançar taxas elevadas no sangue. Na
diabete, como o acesso às células está impedido porque
a “chave” não está disponível, ocorre esse acúmulo. Há dois tipos da
doença. No tipo 1, não há a produção da insulina. Calcula-se que
cerca de 10% sejam vítimas dessa disfunção. No tipo 2 – a mais
comum –,o hormônio é fabricado no início da doença, mas o corpo desenvolve
resistência à sua ação. Sobra glicose no sangue e, para reagir a isso, o
pâncreas produz mais insulina, até esgotar sua capacidade de funcionamento.
Apesar da gravidade do
problema, a medicina ganha cada vez mais batalhas. Uma das boas notícias vem da
área de medicamentos. O laboratório Aventis Pharma lança nesta semana, no
Brasil, e em vários outros países a Lantus, a primeira insulina com ação 24
horas a chegar ao mercado. É uma ajuda e tanto. Diferentemente das insulinas
disponíveis até agora, com ação média durante 16 horas, a glargina
(princípio ativo da droga) irá manter os níveis do hormônio normais e
constantes durante todo o dia, imitando o que acontece em um organismo sadio.
Portanto, o remédio evita o desequilíbrio dos níveis da glicose e da própria
insulina. Para os pacientes que precisam tomar pelo menos duas doses do
hormônio por dia, a Lantus é um grande alívio. A partir de agora, eles
poderão injetar o hormônio apenas uma vez – o que significa menos
desconforto –, além de terem a certeza de que a diabete estará controlada 24
horas por dia.
Há outra vantagem. O remédio
diminui bastante as chances de ocorrência das crises de hipoglicemia (baixa
taxa de açúcar no sangue), cujos sintomas são mal-estar, tontura, desmaio e,
em casos graves, até coma. O efeito colateral é comum às drogas atuais. Após
o pico de atuação desses remédios, há uma queda abrupta de sua ação no
sangue, o que pode provocar a hipoglicemia. “No caso da glargina, o
desconforto praticamente não acontece, pois sua ação é lenta e duradoura”,
afirma Jorge Gross, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O especialista
testou a eficácia da Lantus em trinta pacientes, durante dois anos.
O mesmo benefício em relação
às crises foi observado pelo endocrinologista Freddy Goldberg, do Hospital
Heliópolis, em São Paulo. Num trabalho feito com 36 pacientes, ele comparou os
efeitos da Lantus e de uma insulina com ação de 16 horas. “O grupo que usou
a glargina teve 50% menos crises de hipoglicemia”, garante o médico. Esses
estudos fizeram parte de um protocolo amplo de pesquisas, iniciado por aqui em
1998. Ao todo, 20 centros brasileiros participaram dos testes, que reuniram 700
pacientes. Os resultados comprovaram a eficácia da droga. Para seu efeito ser
ainda melhor, os médicos poderão associá-la a insulinas de efeito
ultra-rápido, tomadas antes das refeições.
A Lantus é vendida desde 2000
na Alemanha, chegou em 2001 aos Estados Unidos e no final do ano passado
desembarcou na Inglaterra e na Irlanda. Outros laboratórios, porém, estão na
corrida para produzir insulinas com efeito 24 horas. Um deles é o Novo Nordisk.
O produto da empresa dinamarquesa está em fase de análise pelas agências de
liberação de remédios e tem previsão de chegar às farmácias no ano que
vem. Para o paciente, quanto mais opções de tratamento, melhor. O
universitário paulistano André Falanca, 21 anos, é portador da diabete tipo 1
e já está usando a glargina (o produto podia ser importado). Antes, André
aplicava as insulinas de efeito lento pelo menos duas vezes ao dia. “Estou
satisfeito e me adaptando bem”, conta.
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