A relação - ou falta de - entre o direito e a internet no Brasil foi tema de um debate que atraiu dezenas de campuseiros nesta quinta-feira ao palco Blog da Campus Party Brasil 2009. Na mesa estavam Ronaldo Lemos (professor da Fundação Getúlio Vargas e um dos idealizadores do blog Overmundo), os advogados Rony Vainzof (do escritório Ópice Blum) e Ivo Corrêa (do Google Brasil) e o jornalista Francisco Madureira (como moderador). Ao falar sobre a necessidade de uma regulamentação para a internet, Lemos disse que "ser blogueiro no Brasil é ser herói, porque você não sabe o que pode acontecer."
Ele defendeu o estabelecimento de um marco civil (e não criminal, como o projeto de lei do senador Eduardo Azeredo, que já foi aprovado no Senado) e destacou que é hora de a sociedade brasileira decidir em que medida é necessário proteger o direito de privacidade, "que não pode ser ignorado", e também a questão da responsabilidade dos provedores (aqui entendido como qualquer um, cidadão ou organização, que publique conteúdo na web).
Para Lemos, a quebra do sigilo do internauta se justificaria apenas em casos de "crimes de maior poder ofensivo" - como pedofilia, seqüestro ou tráfico. "Com a regulamentação, o blogueiro deixa de ser herói e passa a ser um sujeito que sabe até onde pode ir, os riscos que corre", explicou. Ele disse ainda que não saber o que pode acontecer atrapalha a inovação - precisamos de riscos previsíveis também para criar.
Ivo Corrêa vê no centro da questão um descompasso: a ausência de leis específicas faz com que a internet seja tratada como um meio de comunicação tradicional. "Como se o Google tivesse, sobre o Orkut, a mesma ingerência que a Folha de S. Paulo tem sobre o seu conteúdo", exemplificou, citando ainda a relação entre internet e eleições no Brasil. "A lei eleitoral não trata exatamente da internet então, em linhas gerais, ela foi tratada como se fosse a TV ou um jornal. E o potencial de comunicação da rede foi desperdiçado", afirmou.
Esse poder de comunicação pôde ser visto nas eleições norte-americanas quando, por exemplo, mais pessoas assistiram ao debate no YouTube do que na rede CNN. O presidente Obama foi várias vezes citado por Lemos - "o mundo está mudando, nós temos que mudar com ele" - e Corrêa.
É consenso que há necessidade de regras específicas, assim como é necessário um maior conhecimento, por parte do Poder Judiciário, sobre a internet e sua dinâmica. Para os debatedores, as empresas, a comunidade internauta e o meio acadêmico têm que ajudar nisso.
Rony Vainzof citou a criação de varas especializadas em direito eletrônico como um avanço possível, além das delegacias especializadas em crimes eletrônicos, já existentes em diversas capitais brasileiras. E destacou que "a legislação não vai conseguir acompanhar a evolução tecnológica, mas a população pode mobilizar as mudanças".
A reação ao projeto de lei do senador Eduardo Azeredo foi citada como exemplo do poder de mobilização da internet. E, disseram, esta mobilização tem que se repetir. Este movimento é que pode gerar mudança. "E cadê o movimento? Está aqui, neste evento, na aproximação de blogueiros, indústria, academia, direito", finalizou Lemos.