O ciclo da vida
Com base no passado, cientistas imaginam como serão as criaturas que habitarão
a Terra num futuro distante
Lia Vasconcelos
Há 65 milhões de anos, no
final do período Cretáceo, os dinossauros que dominavam o planeta foram
extintos pelos efeitos do impacto de um objeto celeste que teria atingido a
Terra. Para o processo evolutivo, desastres como esse não representam um ponto
final, mas um novo começo. Ao longo dos anos, novas espécies surgiram,
procurando se adaptar para sobreviver ao clima e à vegetação que,
ciclicamente, mudam no planeta. No passado, o deserto do Saara já foi uma
frondosa floresta tropical e a Amazônia não passava de uma região inóspita
coberta de gelo. A grande dúvida é como será o mundo em cinco milhões, 100
milhões ou ainda 200 milhões de anos.
Dentro de cinco milhões de
anos, os humanos não mais habitarão a Terra, que, inclusive, não terá a
paisagem atual. A floresta tropical brasileira está fadada a desaparecer, dando
lugar a grandes planícies secas e quentes, as chamadas savanas, que devem
ocupar uma área duas vezes maior do que o Alasca. O predador mais voraz da
futura Amazônia será uma estranha ave com dois metros de altura chamada
carcaraçu, que terá como passatempo correr atrás dos babucaris, os últimos
primatas do planeta, legítimos descendentes do macaco uacari-vermelho. Os
carcaraçus serão aves diferentes porque não voarão. Seu ancestral mais
antigo seria o dinossauro e o mais recente, o carcará. As pradarias, que
predominam na América do Norte, devem se transformar num extenso deserto de
areia e rocha.
“As mudanças referentes ao
clima, à vegetação e à movimentação dos continentes são cíclicas”,
afirma Alexander Kellner, paleontólogo do Museu Nacional, do Rio de Janeiro. O
pesquisador explica que no período Triássico, que aconteceu entre 248 e 206
milhões de anos atrás, havia um único supercontinente chamado Pangea, que se
separou até formar os cinco continentes de hoje.
Catástrofes naturais, o
estopim das mudanças, serão abundantes,
mas, daqui a 100 milhões de anos, um desastre provocado pela erupção dos
vulcões causaria uma nova extinção em massa – semelhante à
que atingiu os dinossauros –, o que eliminaria 95% das espécies. Esse
é o tema dos seis episódios de Futuro selvagem, programa exibido
a partir da segunda-feira 2 no canal de tevê pago Discovery Channel.
No especial serão apresentadas imagens computadorizadas de como
será a Terra e a vida selvagem no futuro bastante distante e, por
hora, ainda hipotético.
Fruto da imaginação de
cientistas de diversas áreas, o programa
sugere que daqui a 100 milhões de anos os oceanos terão invadido
a maior parte dos continentes, enquanto o norte da Antártica dará
lugar a vastas florestas tropicais. Começará então uma nova dança
dos continentes: a Austrália vai comprimir a Ásia e a América do Norte,
formando uma grande cordilheira que abrigará o quadriptérus azul,
ave cujas penas refletirão a perigosa radiação ultravioleta, típica
das regiões muito elevadas.
O imponente predador dos ares
será dotado de três pares de asas
– um só para sustentar seu comprido pescoço. Ele percorrerá longas
distâncias à velocidade de 180 quilômetros por hora e será capaz
de dormir em pleno vôo. O quadriptérus se alimentará das aranhas
de prata, integrantes de uma sofisticada estrutura social de castas,
e os poglos, pequenos roedores e últimos mamíferos do planeta,
serão sua refeição preferida.
Ainda mais no futuro, daqui a
200 milhões de anos, se supõe que na Terra haverá apenas um continente, com
um só oceano. Nele, viverão bichos estranhos como a lula arco-íris, com 40
metros e o artifício de colorir seu corpo para não virar presa fácil, e os
peixes-falcões, seres voadores que se alimentarão das criaturas do mar, do ar
e da terra. Desse ambiente farão parte os ferozes tubalumnis, tubarões
gigantescos que continuam os mais ferozes e velozes predadores do oceano, desde
o tempo dos dinossauros. O que antes era uma cordilheira, fruto da união da
Áustrália, Ásia e América do Norte, será um deserto do tamanho da África,
depois de devastado por poderosos furacões. A megalula será a única espécie
capaz de deixar as águas para se locomover pela selva, onde as chuvas serão
constantes e a umidade, praticamente insuportável.
Todo esse cenário futurista
deve ser visto com prudência. “Não é absurdo acreditar que haverá
novamente um único continente e que regiões do planeta sofrerão mudanças
climáticas. O que não é possível é inferir quais espécies vão surgir, já
que a evolução é um processo aleatório”, reflete Kellner.
|