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Sob o sol quadrado
Um guia bem-humorado ensina executivos corruptos
a sobreviver bem dentro da cadeia
Célia Chaim
Este deveria ser o livro de cabeceira de empresários
(e políticos) bandoleiros se a Justiça do País cumprisse seu papel. Gente
como Pedro Paulo de Souza, ex-dono da falida Encol, que quebrou, deixou 45 mil
mutuários na mão, mas continuou rico. Ou como Salvatore Cacciola, o famoso
banqueiro do ruidoso caso do Banco Marka que aproveitou uma folga do
habeas-corpus para fugir para a Itália, seu país de origem, e nunca mais
voltar, aproveitando-se da lei local, que não extradita os que são natos. Tem
também o Ricardo Mansur, golpista bajulado como o “rei do varejo”.
A lista dos bambambãs que deveriam estar na
cadeia é quase um guia de telefones, o suficiente para transformar em best
seller também no Brasil o livro que, em seis meses, fez um sucesso retumbante
nos Estados Unidos: Quem mexeu no meu sabonete/ guia prático de sobrevivência
para os CEOs e executivos na prisão, de autoria de Andy Borowitz, escritor
conhecido pelo refinado humor que leva ao jornal The New York Times e às
revistas The New Yorker e Newsweek. Lá como cá não faltam escândalos,
falcatruas e os chamados crimes do colarinho-branco. A diferença é que lá
eles vão presos e aqui habitualmente seguem para Miami.
O original em inglês Who moved my soap?
acaba de ser traduzido para o português pela editora M.Books, com muitas dicas
para executivos (que podem dar carona na leitura a políticos) que enfrentam
processos criminais. Andy Borowitz é um humorista e é como humorista que ele
retrata a aventura de milionários (ou pretendentes a) que escorregaram na lama.
Uma delícia. Bem-sucedido roteirista de filmes de Hollywood e de séries de tevê,
ele decidiu escrever o livro depois de perder alguns milhões de dólares em ações
podres das empresas Enron, Tycon e WorldCom. Quem mexeu no meu sabonete?
é uma lição de administração a partir da cela de um presídio, baseada no
relato real de um alto executivo pego com a “mão na massa” e condenado a
cumprir pena em penitenciária de segurança máxima.
“Preocupado com a drástica mudança de vida
que os executivos sofrem quando presos”, o autor ensina desde como fazer as
malas para o xadrez até como tornar a cela um lugar aconchegante e super na
moda, aplicando os princípios da filosofia chinesa feng shui. Quanto à mala,
ele recomenda: só leve cigarros. “O fato de poder levar cigarros deve soar
como uma ótima notícia”, escreve Borowitz. Recorrendo à fúria
antitabagista, ele diz que essa é uma das regalias que tornam a vida atrás das
grades bem mais agradável do que no mundo corporativo. Sobre a comida: “Feche
os olhos, engula a gororoba da prisão e imagine que está num banquete pago
pelos acionistas.” Cuidado com a linguagem de Harvard. Não impressiona ninguém
ali dentro e é bom se empenhar no idioma local – em que, por exemplo, cabeção
é chefe de quadrilha e boi é vaso sanitário – com a mesma dedicação que
aprendeu inglês, francês, alemão. Um minidicionário de gírias utilizadas
nas cadeias de São Paulo facilita a comunicação com outros presos, diminuindo
significativamente seus riscos. É fundamental.
Como toda a experiência de sucesso de um
executivo não pode ser jogada na lata do lixo de um dia para o outro, o livro
aborda, ainda, como o bambambã encarcerado pode aplicar seu conhecimento
utilizando ferramentas de gestão, com o objetivo de melhorar os procedimentos
internos, otimizar os processos e principalmente atingir metas. Lembrete
fundamental aos personagens principais da onda crescente de escândalos
empresariais: aproveite a dádiva do tempo livre para ler grandes livros como Em
busca do tempo perdido, de Marcel Proust. São três volumes, mas tempo,
nestas alturas, não é problema.
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