Trigo pode ser solução de missão tripulada a Marte

Da Redação
Em São Paulo


Este ano Marte ficou mais próximo da Terra do que esteve em mais de 50 mil anos, mas uma nova tecnologia poderá aproximá-lo ainda mais. Cientistas desenvolveram um sistema de tratamento de dejetos totalmente sustentável para vôos espaciais de longa distância, que utiliza um simples subproduto do trigo.

O capim do trigo, uma parte não comestível da planta, pode ser usado para captar os poluentes produzidos pela queima de dejetos em uma nave espacial, segundo pesquisadores do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley da Nasa. O próprio capim do trigo normalmente seria um dejeto, mas agora pode ter utilidade num processo que coloca o programa espacial mais próximo de uma missão tripulada a Marte.

As descobertas estão na atual edição (setembro/outubro) de "Energy & Fuels", uma revista bimensal da Sociedade Americana de Química, uma das maiores sociedades científicas do mundo.

Uma missão tripulada a Marte é uma antiga meta do programa espacial, mas ainda é apenas uma perspectiva para um futuro muito distante. Essa missão levaria cerca de três anos, dependendo da proximidade de Marte em sua órbita.

"Nesses três anos você não pode receber suprimentos da Terra, como na estação espacial", diz Shih-Ger Chang, cientista do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, na Califórnia, e principal autor do trabalho. "Por isso a chave é desenvolver um suprimento sustentável de material para os astronautas. Eles precisam de um sistema de apoio à vida totalmente regenerativo, porque precisam conservar os materiais que podem transportar."

O principal problema que os astronautas enfrentarão será sua própria "biomassa" - fezes humanas e partes não comestíveis de plantas cultivadas para alimentação, como o capim de trigo. "Se eles jogarem capim de trigo ou fezes humanas no espaço, estarão jogando fora nutrientes", diz Chang. "Os astronautas precisam recuperar tudo para reutilização."

Um método promissor para lidar com esses dejetos é queimá-los. A incineração transforma rápida e completamente o lixo em dióxido de carbono, água e minerais, e é uma tecnologia totalmente desenvolvida aqui na Terra. Embora as plantas prontamente absorvam o dióxido de carbono, a maior dificuldade da incineração, especialmente em uma nave fechada, é que ela produz outros poluentes, como dióxido de enxofre e óxidos de nitrogênio.

Temos meios eficazes para lidar com esses poluentes na Terra, mas todos exigem materiais que são consumidos, como carbono ativo, que precisa ser substituído a intervalos de meses.

É aí que entra em cena o cultivo de trigo no espaço. A parte não comestível do trigo -o capim- pode ser transformada em carbono ativo a bordo do veículo espacial, através do aquecimento a cerca de 600 graus centígrados. As emissões da incineração de dejetos são passadas pelo carbono ativo, que absorve os óxidos de nitrogênio. Estes são posteriormente recuperados e transformados em nitrogênio, amônia e nitratos. O nitrogênio pode ser usado para substituir o vazamento de pressão da cabine, enquanto a amônia e os nitratos podem ser usados como fertilizante. Quando o carbono ativo perde sua capacidade de absorver os óxidos de nitrogênio, o processo recomeça com mais capim de trigo.

Em pesquisas anteriores, Chang e seus colegas demonstraram que o gás da incineração da biomassa contém quantidades insignificantes de dióxido de enxofre, por isso nesse estudo eles concentraram seus esforços no controle dos óxidos de nitrogênio.

O trigo para uma nave espacial pode ser cultivado de forma hidropônica - em uma solução nutriente exposta à luz solar artificial.

Cerca de 203 quilos de carbono derivado da palha de trigo poderiam ser produzidos por ano, o que seria mais que suficiente para sustentar uma equipe de seis astronautas, segundo os cálculos de Chang. "É um processo reciclável e sustentável", diz o cientista.

A tecnologia também é simples de operar e funciona sob condições de microgravidade. A Nasa está planejando estudos para aperfeiçoar o processo em seu Centro de Pesquisas Ames, em Moffett Field, Califórnia.

 

 

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