Cientistas descobrem partículas sociáveis

Kenneth Chang
The New York Times


Oito anos após os físicos induzirem átomos ultrafrios a formar um novo tipo de matéria no qual milhares de átomos adquirem o comportamento sincronizado perfeito de uma única superpartícula, duas equipes de pesquisa repetiram o feito usando moléculas pequenas.

O feito fornecerá aos físicos um novo meio de explorar o comportamento freqüentemente bizarro da matéria altamente esfriada, como cabos que transmitem sem esforço a eletricidade e fluidos que fluem sem fricção. Em particular, uma classe de materiais, os supercondutores de altas temperaturas, continuam a desafiar explicação.

"Ninguém tem uma teoria para descrever estas coisas", disse Rudolf Grimm, professor de física experimental da Universidade de Innsbruck, na Áustria, que liderou um dos grupos de pesquisa. "Esta é exatamente a situação que podemos apontar agora".

Eles exploraram um estado da matéria conhecido como condensado Bose-Einstein, batizado em homenagem a Albert Einstein e o teórico indiano Satyendra Nath Bose. Einstein e Bose previram em 1920 que muitos bósons idênticos -uma das duas classes fundamentais de partículas- poderiam adquirir um "estado quântico" e, quando suficientemente esfriadas, se fundiriam no condensado, que age como uma única partícula coerente.

Em 1995, cientistas da Universidade do Colorado e do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia, em Boulder, produziram o primeiro de tais condensados resfriando átomos de rubídio a menos de um milionésimo de grau acima do zero absoluto (-459,67 graus Fahrenheit), a temperatura na qual os átomos se aproximam de uma parada quase completa.

O progresso nesse campo tem acelerado em um ritmo vertiginoso, à medida que os físicos aprenderam a transformar a outra classe de partículas do Universo, os férmions, também em condensados. Apesar dos bósons se fundirem uns aos outros sem queixas, os férmions, que incluem elétrons e prótons, são quanticamente anti-sociais. Os férmions não conseguem compartilhar o mesmo estado quântico e não podem formar diretamente um condensado Bose-Einstein.


Mas como duas pessoas não amistosas que se tornam um casal capaz de conviver junto, dois férmions podem se juntar em uma molécula que age como um bóson, e um gás de tais moléculas pode se fundir em um condensado. O grupo de Grimm realizou tal feito com átomos de lítio, e uma equipe concorrente do laboratório do Colorado, liderada por Deborah S. Jin, fez o mesmo com potássio. "As pessoas estão interessadas em moléculas", disse Jin. "As moléculas podem fazer coisas novas e interessantes que os átomos não podem".

Cada grupo realizou suas experiências nos últimos meses, e em 3 de novembro ambas apresentaram relatórios com os resultados. Os resultados foram publicados nas revistas "Science" e "Nature" nas edições de 13 e 26 de novembro, respectivamente.

"Os dois trabalhos representam um grande avanço esperado pelas pessoas há muito tempo", disse Eric A. Cornell, do Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia, que dividiu o Prêmio Nobel de Física de 2001 pela experiência original Bose-Einstein. Transformar férmions em um estado bosônico, ele acrescentou, é uma "união adorável de duas coisas que no mundo da física nós costumávamos pensar ser tão diferentes quanto homens e mulheres".

"A importância deste trabalho está no que está por vir", disse Randall G. Hulet, professor de física da Universidade Rice, em Houston. "Isto abrirá novas direções nas quais explorar fenômenos como a supercondutividade, mas em sistemas muito mais simples, mais fáceis de compreender."

Com uma forte força atrativa, os átomos se unem em moléculas que se aglutinam em um condensado Bose-Einstein. Quando a atração é muito mais fraca, os átomos ainda se unem. O parceiro não é o vizinho mais próximo, mas um mais distante. O fenômeno, conhecido como par de Cooper, sustenta o comportamento dos supercondutores, que conduzem eletricidade virtualmente sem nenhuma resistência elétrica, e dos superfluidos, que fluem sem fricção.

As atuais teorias fazem um bom trabalho em explicar os condensados Bose-Einstein e os pares de Cooper, mas não o intervalo entre eles. Variando o campo magnético aplicado a um gás, os físicos agora poderão ser capazes de mudá-lo de pares de Cooper para um condensado Bose-Einstein e reverter novamente, estudando sistematicamente o processo ao mesmo tempo.

"As pessoas realmente não sabem o que acontece quando você passa por tal transição", disse Hulet. Isto, por sua vez, poderá fornecer pistas importantes de supercondutores de altas temperaturas. Tais materiais, descobertos em 1986, estão começando a encontrar amplo uso comercial, apesar dos cientistas ainda não entenderem como funcionam e por que funcionam em temperaturas consideravelmente mais quentes que outros supercondutores.

Nos supercondutores, os elétrons formam pares de Cooper que carregam corrente elétrica sem esforço. Alguns téoricos dizem que uma atração mais forte entre os elétrons nos supercondutores de altas temperaturas, semelhante à atração entre os átomos no condensado Bose-Einstein, gera as propriedades singulares.

Como o condensado Bose-Einstein molecular consiste de um único elemento, ele deve ser mais fácil de estudar do que os supercondutores de altas temperaturas, com misturas complexas. Por exemplo, a condutividadade nos supercondutores de altas temperaturas parece ser um processo em duas etapas. Em uma temperatura, os elétrons se combinam em pares de Cooper, mas não geram supercondutividade até que a temperatura é reduzida ainda mais.

Alguns especialistas teorizam que o processo em duas etapas é central para a supercondutividade em alta temperatura. Outros dizem que é uma característica periférica, não relacionada, dos materiais.

"A parte da mecânica quântica já é difícil o suficiente", disse Hulet. "Ele está abrindo uma nova porta para podermos explorar a supercondutividade com maior sensibilidade, com maior pureza", disse ele sobre os condensados Bose-Einstein. "Nós podemos testar os modelos que foram propostos".



Tradução: George El Khouri Andolfato
 

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