Francis PisaniA relação com o tempo talvez seja o que
mais separa o Vale do Silício daquilo que observo à minha volta
no resto do mundo. Na Califórnia, todo o sistema repousa, por
bons motivos econômicos, na velocidade de concepção, execução e
na estratégia de saída (a aquisição ou abertura de capital da
empresa). Isso está integrado até ao desenvolvimento de
aplicativos, com o conceito de "versão beta", que consiste em
colocar um produto no mercado antes que este esteja pronto, e
melhorá-lo levando em conta as reações dos usuários.
Mas do Brasil à Índia, e em todos os demais lugares que
visitei recentemente, o tom parece muito diferente. Em Recife,
Sílvio Meira --professor de informática que desempenhou papel
chave no desenvolvimento da cidade conhecida como terceiro polo
tecnológico do Brasil (atrás apenas de São Paulo e do Rio de
Janeiro), me disse que "o Vale do Silício demorou 30 anos para
consolidar sua posição. A Índia está se esforçando para
desenvolver Bangalore desde os anos 70. Não é algo que possa ser
realizado com uma varinha de condão. É precisa capacitar dezenas
de milhares de engenheiros e aprender a operar
sistematicamente". E também é preciso, sempre, despertar o
espírito empresarial.
Em Jacarta, Indonésia, Mamuaya Rama --fundador do site de
informações
DailySocial.net me acompanhou em uma visita à incubadora
Merah Putih, explicando que as empresas iniciantes demoram muito
a sair da incubadora --18 meses ou mais. "A maioria delas é
criada por pessoas muito jovens e sem experiência de negócios,
como eu. O objetivo é nos estabelecermos como empresas estáveis.
E para consegui-lo não se pode estabelecer um limite de prazo".
Em Mumbai, Índia, Vishal Gundal, empreendedor tornado
empresário, também estudou o processo do Vale do Silício. Não
apenas "o que se faz nos Estados Unidos em dois anos aqui demora
quatro ou cinco, e o longo prazo pode se estender a sete ou 10",
como a dinâmica não ganha ímpeto até que uma ou duas empresas
iniciantes consigam sucesso suficiente para entusiasmar os
jovens e inspirá-los a realizar aventura semelhante.
É uma ideia acentuada por Poyni Baht --diretora da SINE, a
incubadora do Instituto Indiano de Tecnologia em Bombaim, criada
em 1999. "Faltam-nos exemplos", disse. "Não contamos com
empresários de sucesso suficiente para criar uma comunidade. A
experiência é limitada. E fracassar continua a ser tabu. É uma
questão de ecossistema".
Mahesh Samat, ex-diretor da Disney na Índia, está convicto de
que "os mercados emergentes não crescerão de um dia para o
outro. Não foi o que aconteceu nos Estados Unidos e nem na
Europa. Seguirão uma curva normal. O crescimento vertiginoso é
uma exceção".
O dinheiro não é um verdadeiro problema. Está disponível em
toda parte, mas as pessoas que o têm não estão habituadas a
riscos e desconfiam da intangível economia do conhecimento.
Preferem "dar dinheiro a um filho idiota que a um desconhecido
que o mereça", disse o empresário e investidor Mahesh Murthy,
ele mesmo integrante de uma estirpe de brâmanes. Tudo isso vai
mudar, mas será preciso esperar o amadurecimento de jovens
criados na cultura digital e filhos de famílias ricas.
Há duas lições a extrair quanto à importância do tempo para o
desenvolvimento da inovação em todo o mundo. A primeira é que a
vontade de agir com rapidez pode ser uma armadilha, tanto para
os investidores locais ansiosos por imitar o Vale do Silício
quanto para os estrangeiros impacientes por aplicar um modelo
que funciona em seus países a outros mercados.
A segunda é que o mundo pode ser plano mas não é liso.
Policrônico, opera em diferentes velocidades a um só tempo. A
inovação requer dinheiro, organização, desenvolvimentos
líquidos, mas seu avanço está entremeado de comportamentos
herdados da tradição... e que se movem em câmera lenta.
Mas não nos equivoquemos. A verdadeira constante, por trás
desses tempos múltiplos, é que a inovação fervilha em toda
parte.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Folha Online