Karen Miller
Da Nasa
Confuso? Então você se sente como plantas em uma estufa
instalada em Marte.
Não existem estufas no planeta,é claro, mas os exploradores de Marte
ou da Lua precisarão cultivar plantas para fins de alimentação,
reciclagem e abastecimento de ar, em qualquer missão de longo prazo. E
as plantas não compreenderão que estão fora do ambiente da Terra. O
fim para o qual evoluíram não é aquele, e a situação que enfrentarão
não é a que esperam.
Mas, aparentemente, de certa forma elas vão gostar mais da experiência.
Ou pelo menos de algumas partes dela.
"Quando você tem
a idéia de cultivar plantas na Lua, ou em Marte", explica o biólogo
molecular Rob Ferl, diretor de Pesquisa e Educação de Biotecnologia e
Agricultura Espacial na Universidade da Flórida, "é preciso
considerar a idéia de cultivar plantas sob a mais baixa pressão atmosférica
possível".
Há dois motivos para isso. Primeiro, o processo ajudaria a reduzir o
peso dos suprimentos que precisariam ser carregados da Terra. Até mesmo
o ar tem massa.
Segundo, as estufas em Marte e na Lua precisariam se sustentar em
lugares nos quais a pressão atmosférica é, na melhor das hipóteses,
menos de 1% do que consideramos normal na Terra. Essas estufas serão
mais fáceis de construir e operar caso a pressão interna que as afeta
seja, igualmente, muito baixa -talvez apenas 6% da pressão normal na
Terra. O problema é que pressões extremamente baixas como essas exigem
que as plantas trabalhem com afinco para sobreviver. "Lembrem-se,
as plantas não têm pré-adaptação evolutiva a condições hipobáricas",
diz Ferl. Não existe razão para que tenham aprendido a interpretar os
sinais bioquímicos induzidos pela baixa pressão. E, na verdade, elas não
o fazem. Os sinais são interpretados pelas plantas de maneira indevida.
A baixa pressão faz com que as plantas se comportem como se estivessem
perdendo a hidratação.
Em experiências recentes, patrocinadas pelo Serviço de Pesquisa Física
e Biológica da Nasa, o grupo de Ferl expôs as plantas jovens, em
crescimento, a uma pressão equivalente a 10% da terrestre, por cerca de
24 horas. Em um ambiente de tão baixa pressão, a água é expelida
pelas folhas com muita rapidez, e é preciso líquido adicional para
reabastecê-las.
Mas, diz Ferl, as
plantas receberam toda a água de que precisavam. A umidade relativa do
ar, além disso, foi mantida em quase 100%. Ainda assim, os genes das
plantas que servem como sensores de seca estavam sendo ativados.
Aparentemente, disse Ferl, as plantas interpretavam o movimento
acelerado da água como desgaste induzido pela seca, mesmo que não
houvesse qualquer deficiência de umidade em suas folhas.
Isso é um problema. As plantas estariam desperdiçando recursos caso os
despendessem tentando enfrentar uma dificuldade que na realidade não
existe. Por exemplo, poderiam fechar seus estômatos, os pequenos
buracos existentes nas folhas pelos quais a água escapa. Ou poderiam se
desfolhar completamente. Essas respostas, no entanto, não seriam
necessariamente apropriadas.
Felizmente, assim que o mecanismo de resposta das plantas à alteração
de pressão for compreendido, os pesquisadores serão capazes de ajustá-lo.
"Podemos fazer alterações bioquímicas que alteram o nível dos
hormônios", disse Ferl. "Podemos aumentá-lo ou reduzi-lo
para afetar a resposta das plantas ao seu ambiente".
E, intrigantemente, os estudos descobriram que os ambientes de baixa
pressão podem oferecer certos benefícios. O mecanismo é
essencialmente semelhante àquele que causa os problemas, explica Ferl.
Sob baixa pressão, não só a água mas os hormônios vegetais são
expulsos mais rápido das plantas. Assim, por exemplo, um hormônio que
leve a planta a morrer de velhice talvez atravesse seu organismo e seja
expelido antes que possa fazer efeito.
Os astronautas não serão os únicos a se beneficiar dessa pesquisa. Ao
controlarmos a pressão do ar em, digamos, uma estufa ou um silo de
armazenagem na Terra, talvez seja possível influenciar determinados
comportamentos vegetais. Por exemplo, se frutas forem armazenadas sob
baixa pressão, elas duram muito mais. Isso se deve à eliminação
acelerada do hormônio etileno, que faz com que as frutas amadureçam e
a seguir apodreçam. Os produtos agrícolas transportados de caminhão
entre as duas costas dos Estados Unidos em contêineres de baixa pressão
poderiam chegar aos supermercados tão frescos como se tivessem sido
colhidos naquele mesmo dia.
Resta ainda muito
trabalho a ser feito. A equipe de Ferl estudou a forma pela qual as
plantas reagem a períodos curtos de baixa pressão. Mas é preciso
ainda determinar como as plantas reagem à passagem de períodos
prolongados -como toda a duração de suas vidas- em condições hipobáricas.
Ferl também espera examinar as plantas sob uma gama mais ampla de níveis
de pressão. Existem conjuntos completos de genes acionados a diferentes
pressões, diz ele, e isso sugere uma resposta surpreendentemente
complexa aos ambientes de baixa pressão.
Para aprender mais sobre essa resposta genética, o grupo de Ferl está
empregando a bioengenharia para criar plantas cujos genes assumem uma
tonalidade verde quando ativados. Além disso, estão tecnologia de
microchips de DNA para examinar até 20 mil genes a um só tempo, em
plantas expostas a condições de baixa pressão atmosférica.
As plantas terão papel extraordinariamente importante a desempenhar nos
programas que permitirão aos seres humanos explorar destinos como Marte
e a Lua. Elas fornecerão alimentos, oxigênio e até mesmo ânimo aos
astronautas distantes de casa. Para fazer o melhor uso possível das
plantas, fora da atmosfera terrestre, "é preciso compreender os
limites que existem ao seu cultivo sob condições de baixa pressão",
diz Ferl. "E a seguir precisamos compreender por que esses limites
existem".
O grupo de Ferl está fazendo progresso. "A parte excitante disso
tudo é que estamos começando a compreender o que realmente será
necessário para que usemos plantas em nossos sistemas de sustentação
da vida". Quando chegar a hora de visitar Marte, as plantas nas
estufas interplanetárias talvez não se sintam tão confusas.
Tradução: Paulo
Migliacci