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Os bocas de cabra
Motor criado no Brasil inaugura a onda dos carros versáteis,
que rodam com álcool ou gasolina
Ricardo Dilser
De tempos em tempos, a indústria
automotiva ressurge das cinzas, como uma fênix.
Este ano, quando as montadoras amargam um dos maiores prejuízos de sua história,
a arma para alavancar as vendas é a materialização de um sonho que há cinco
anos parecia improvável: um motor que queima gasolina, álcool ou qualquer
mistura dos dois combustíveis, sem que o motorista nem sequer perceba. Fruto de
uma tecnologia 100% tupiniquim, o motor flexível garante liberdade, autonomia e
transfere ao consumidor o poder de pressão sobre o preço nos postos de
abastecimento.
“Com o advento da eletrônica,
usamos a tecnologia para facilitar
a vida do usuário”, revela Eduardo Campos, um dos engenheiros envolvidos no
projeto multicombustível da empresa Magneti Marelli, responsável pela injeção
eletrônica do Volkswagen Gol, o primeiro
modelo nacional a aderir ao motor versátil. Na carona, vieram Corsa 1.8 e
Montana 1.8 FlexPower, da Chevrolet; Palio 1.3 Flex, da Fiat; e, mais
recentemente, Parati, Saveiro 1.6 Total Flex e Fox, nas versões 1.0 e 1.6, da
Volkswagen. A estimativa é que em menos de dois anos todos os carros nacionais
estejam equipados com esses propulsores, já disponíveis em série nos carros
zero km.
Economia –
Se a promessa se concretizar, o cliente será, pela primeira vez, um braço na
formação dos preços de combustíveis, hoje uma exclusividade das petrolíferas
e dos usineiros. A gasolina aumentou de preço? Passe a usar somente álcool.
Aumentou a cotação do açúcar no mercado internacional e pode faltar álcool
nos postos? Coloque gasolina e pronto. Fácil, sem ligar nenhuma chave, nem
fazer ajuste ou regulagem. Através de um sensor no escapamento, a injeção
eletrônica multi-fuel detecta, automaticamente, qual mistura de combustível é
queimada no motor e refaz os ajustes para que o propulsor funcione.
Devido às características
singulares do álcool, os carros multi-fuel trazem ainda tanque, tubulações,
bicos injetores e bomba de combustível mais resistentes à corrosão e sistema
de partida a frio. Nos primeiros protótipos, um sofisticado aparelho media a
densidade do combustível, indicando ao motor qual mistura estava no tanque.
Perfeito do ponto de vista técnico, só que onerava em demasia o custo do
equipamento, inviabilizando sua oferta aos consumidores. Por falar em oferta, a
marca Chevrolet não cobra nada pela tecnologia, já que todos os Corsa 1.8 e a
picape Montana 1.8 são oferecidos, de série, com motor Flexpower. A Fiat também
não cobra nenhum centavo a mais pelo Palio 1.3 Flex, enquanto a Volkswagen
acrescenta cerca de R$ 150 aos preços básicos de Gol, Parati e Saveiro 1.6
quando equipados com propulsor Total Flex.
O fato curioso é que,
dependendo do combustível queimado, os valores de potência e de consumo
variam, já que o poder calorífico da gasolina (10.500 kcal) e o do álcool
(6.500 kcal) são diferentes. Tome-se como exemplo o Fiat Palio 1.3 Flex. Quando
alimentado com gasolina, ele atinge 157 km/h de velocidade final. Com álcool,
chega aos 159 km/h.
No bolso, aí, sim, dá para sentir mais. O Palio Flex percorre na cidade
9,2 km com um litro de álcool; já com um litro de gasolina, ele anda pelo
menos um terço a mais: 13 km. Mesmo assim, ainda é vantagem rodar só com álcool,
já que a gasolina custa quase o dobro do combustível vegetal.
A expectativa é
que nos próximos seis meses, o motor se torne ainda mais flexível. Além de
rodar com álcool e gasolina, ele poderá queimar gás natural veicular (GNV).
Com isso, o consumidor não vai precisar mais queimar suas pestanas.
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