O que não mata cura?


Em pequenas doses, venenos letais podem ter efeitos terapêuticos

Fernanda Colavitti

Você acha que aquela velha máxima, segundo a qual "a diferença entre o remédio e o veneno está na dose", não passa de força de expressão? Pois saiba que a frase vem ganhando diversas evidências científicas. Entre elas, as de que, em pequenas quantidades, a exposição à dioxina (substância contida no agente laranja, o herbicida despejado pelos EUA durante a guerra do Vietnã para desfolhar as florestas e expor os vietcongues) e à radiação podem reduzir o risco de desenvolver câncer, o arsênico trióxido (um dos mais poderosos poluentes) ajudaria no tratamento de um tipo raro de leucemia e de que a nicotina evita a incidência de Alzheimer.

A idéia de que doses mínimas de substâncias tóxicas fazem bem ao organismo foi descrita pela primeira vez em 1888 e ficou conhecida como "hormese". Seu princípio geral é o de que ao entrarem em contato com poucas quantidades de veneno, as células reagem a esse estímulo negativo tornando-se mais resistentes.

A idéia predominou até a década de 1930, quando perdeu credibilidade. Os principais motivos foram a dificuldade em medir e quantificar seus efeitos e de explicar sua ação.
Para completar o quadro desfavorável, a hormese também passou a ser associada à homeopatia (cujas doses de toxina recomendada são muito menores do que as que desencadeariam a hormese) e acabou se tornando uma espécie de "patinho feio da toxicologia", ficando esquecida pela comunidade científica durante décadas. Mas, nos últimos meses, o controverso debate (ainda longe de chegar a algum consenso) voltou a freqüentar as páginas de prestigiadas revistas científicas, como a britânica "Nature" e a americana "Science".

O tema está em evidência novamente devido à insistência do toxicologista norte-americano Edward Calabrese, da Universidade de Massachusetts, que passou a última década compilando mais de 20 mil estudos sobre pesticidas, metais, gases e outras substâncias tóxicas que dão suporte à tese da hormese.

Calabrese também edita um site (www.belleonline.com) e um boletim eletrônico batizado de Belle (sigla em inglês para Efeitos Biológicos dos Baixos Níveis de Exposição) que divulga esses trabalhos.

Mas por que essa obstinação? "A melhor compreensão dos efeitos da hormese poderia resultar em tratamentos mais eficientes para quaisquer tipos de problemas", disse Calabrese a GALILEU

 

 

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