Brasil pode perder o trem da economia digital


Renato Rodrigues
Editor-assistente de Mundo Digital

Na Era da economia digital, há dois tipos de países: os que embarcaram nesse trem e os que estão proseando na estação, vendo a chance passar. Estados Unidos, Cingapura, Finlândia, Suécia e Dinamarca são exemplos de passageiros dos primeiros vagões, enquanto Angola, Haiti, Etiópia e Chade (África) sequer têm bilhetes para a classe econômica.

E o Brasil, onde fica nessa?

Infelizmente, há uma boa chance de ficarmos fora desse trem. Segundo o ranking dos países mais preparados para tirar proveito da economia em rede, o Brasil está em 39° lugar, imediatamente atrás da Tailândia e a sete posições do latino-americano mais bem colocado, o Chile. O resultado faz parte do Relatório Mundial de Tecnologia de Comunicação e Informação (TIC) 2003-2004, um trabalho do Banco Mundial e do Fórum Econômico Mundial divulgado nesta semana em Genebra (Suíça).

A posição dos países é fruto de uma combinação de três índices. O primeiro é o ambiente macro-econômico, que se refere a condições de mercado, infra-estrutura e legislação do setor de TIC. Mede-se também a capacidade do público (população, empresas e governo) de usar a estrutura de TIC disponível. Por fim, o uso efetivo que esses grupos fazem da tecnologia de rede.

Embora em si a posição do Brasil não seja catastrófica, preocupante é a tendência. No relatório anterior, referente ao biênio 2002-2003, o país ocupava a 29ª posição, enquanto o Chile foi o 35°.

Segundo Carlos Arruda, professor na Fundação Dom Cabral, a queda brasileira não foi surpreendente. "Devido aos altos juros, à carga tributária e às leis, o custo do investimento em TIC no Brasil é altíssimo, e isso desestimula as empresas do setor", diz.

A Fundação Cabral é um centro de desenvolvimento de executivos, empresários e empresas reconhecido por suas pesquisas e parcerias com universidades. Foi o responsável por coletar os dados brasileiros que constam do relatório.

No ranking que mede o ambiente político e regulatório do setor de TIC, o Brasil ocupa a 43ª posição, atrás de Ghana e Botswana, na África, e de El Salvador, na América Central.

Para Arruda, 2004 também não promete evolução para o país, ao menos no ranking. "O relatório do ano que vem irá refletir os dados de 2003, que foi um ano ruim para a economia como um todo", avisa.

Além de ficar para trás na corrida pelo escalão da frente da economia online, o Brasil também tem de se preocupar com a aceleração dos outros "concorrentes", como a China e a Coréia, diz Arruda. "Perdemos posições não somente devido ao nosso passo lento, mas também pela aceleração de outros países".

A economia digital pressupõe a circulação descomplicada de bens e serviços e o investimento constante em melhorias tecnológicas e no aumento da eficiência de processos. Em bom português, economias que fazem bom uso dos sistemas em rede são mais eficientes e permitem que as empresas paguem salários melhores aos empregados.

O exemplo mais claro disso são os dos líderes do ranking, os americanos. Graças ao investimento intenso em TIC durante a segunda metade dos anos 90, o país teve fortes taxas de crescimento da produtividade, o que permitiu crescimento da economia sem aumento da inflação. Trata-se de uma benção macroeconômica que só é possível quando as empresas têm um ambiente favorável aos investimentos de longo prazo, como é o caso de TIC.

No Brasil, o cenário é bem diverso. "Temos problemas de infra-estrutura econômica (legislação fiscal e tributária) e mesmo física", aponta Arruda. Além disso, investe-se pouco no Brasil em Pesquisa & Desenvolvimento -apenas 1,5% do PIB. Os EUA, que possuem uma economia 11 vezes maior, essa fatia é de 4,5%. E mais: no Brasil, a maior parte da pesquisa em inovações é feita dentro dos laboratórios das universidades -muitas vezes avessos à realidade do mercado-, e não dentro das empresas. Nos países desenvolvidos, acontece justamente o contrário.

Pesa também o abismo educacional brasileiro, que persiste firme e forte apesar dos avanços dos últimos anos. No ranking que mede o preparo das pessoas e o grau de conectividade para usar as tecnologias de informação, o Brasil está em 59° lugar, seis posições atrás do México, único país latino-americano cuja população, numericamente, é semelhante à brasileira.

O ranking não serve apenas para comparar países em um campeonato global. Para isso, há o ranking da Fifa. O NRI (Índice de preparo para a Economia em Rede), como é chamado, permite a um país balizar seu desempenho e determinar a efetividade de suas políticas para o setor de TIC. Também permite que um país aprenda com as políticas de outras nações com perfis semelhantes, para identificar as melhores práticas.
 

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