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Sobre
mestrados e bromélias
A experiência de um profissional no mundo acadêmico
Hoje vamos falar sobre mestrado, não sobre arquitetura da
informação. Ainda que AI tenha sido o tema da minha
pesquisa, quero contar um pouco sobre esta experiência, o
que aprendi e o que talvez ajude quem pretende ingressar no
mundo acadêmico.
Para começar, quem opta por fazer um mestrado deve estar
ciente de que enfrentará leituras intermináveis, horas e
horas de computador, biblioteca, internet e imersão em
pesquisas. Não, isso não é ruim. Pelo contrário. O mundo
que se abre é fascinante! Em determinado momento, no início,
nos sentimos perdidos na imensidão do saber, ávidos por
devorar todas as leituras, perdidos em cada bifurcação que
encontramos, cada desdobramento de cada subtema que
pesquisamos.
A questão é: prepare-se para o mestrado. Reserve muitas
horas do seu dia. Saiba que as disciplinas são a parte mais
fácil do processo: se parece complicado assistir aulas de
14 às 22h de todas as quartas-feiras durante seis meses
(pelo menos na PUC-Rio as aulas do mestrado eram sempre à
tarde), isso não é nada perto das horas intermináveis em
cima de pesquisas, leituras, compilação de dados e digitação
da sua dissertação. Fora as noites mal-dormidas...
Mas vamos pela ordem cronológica dos fatos.
Então, tendo ciência da absorção que esse processo
causa, vem outra etapa fundamental: a escolha da pesquisa.
No meu caso lembro bem da professora Anamaria de Moraes
(Doutora em Comunicação – ECO/UFRJ) me olhando, por cima
do seu par de óculos de enorme armação vermelha, com os
olhos arregalados, muda por alguns segundos quando respondi
simplesmente que eu queria pesquisar a Arquitetura da
Informação (ponto). Hoje entendo bem. Mas na hora tive a
sensação de que ela talvez não tivesse me entendido. Na
verdade ela estava assustada com o meu “recorte” do
problema :)
No mestrado há disciplinas de metodologia da pesquisa onde
descobre-se tudo sobre tema, problema, objeto, hipótese,
variáveis, essas coisas. Mas quando se entrega o pré-projeto
esses conceitos ainda são muito vagos. Eu não tinha então
noção de que a tal da A.I. era “apenas” o tema da
minha pesquisa. E que, na verdade, pesquisar a arquitetura
da informação era uma resposta tão vaga quanto dizer que
gostaria de pesquisar a primavera...
Quando se recorta uma pesquisa estabelece-se um foco e um
limite para ela. O que exatamente sobre a primavera você
quer estudar? A floração? Pois bem, mas de que espécie?
Bromélias? Ainda MUUUUITO amplo. Bromélias fasciatas, por
exemplo? Só no litoral, ok? Ah, e em locais com baixa
luminosidade, sem terra, apenas em água. Tem-se um recorte:
a floração das bromélias fasciatas hidropônicas durante
a primavera sob baixa luminosidade. Bem... minha pesquisa não
foi sobre bromélias e posso ainda estar falando uma grande
besteira sobre este assunto, mas acho que consegui passar a
mensagem.
Eu só fui dar valor mesmo ao meu recorte quando bateu uma
imensa angústia e me dei conta que não ia dar tempo. Ali a
clara percepção do que tinha ou não a ver com a minha
pesquisa foi fundamental! Parece óbvio se dito assim mas
acredite, não é. Às vezes o que exclui um determinado
artigo das suas referências é uma linha muito tênue, uma
abordagem um pouco diferente, um olhar enviesado que o autor
deu ou ainda um nível de profundidade que não interessa
sobre aquele determinado tópico. Mas a gente acaba
arquivando pra ler um dia... (minha pastinha “Artigos para
ler” ficou com 15 Mb!)
Um outro ponto interessante que aconteceu comigo, talvez
porque passei onze anos longe de uma universidade até
tentar o mestrado, foi a questão de querer obter um
resultado palpável na pesquisa.
Nesse momento, um toque absolutamente profícuo, que recebi
do meu amigo e mestre Sydney Freitas (Doutor em Engenharia
da Produção - UERJ/ESDI), caiu como uma luva. Ele me
mostrou que uma pesquisa acadêmica roda exaustivamente em
torno (e apenas) do problema, olhando para ele sob todos os
pontos de vista, buscando descobrir todos os fatos que
inferem, geram e o que ocorre com ele. A solução? Aquela
que buscamos cegamente no nosso trabalho – já que o
cliente nos paga por ela e não para que fiquemos rodando em
cima do problema – essa não é uma obrigação do
pesquisador.
Isso para mim foi revelador! E, confesso, extremamente
sedutor. Passei anos e anos trabalhando e me preocupando 99%
do tempo com a solução, com a forma, com aquela coisa palpável
que depois, além de recebermos por ela, colocamos no portfólio.
De repente me vi numa situação completamente nova de ter
todo o tempo do mundo (tá bem, vai... dois anos) para me
ater apenas ao problema.
Isso é a pesquisa acadêmica. Olhar para o problema e tudo
que o cerca, trazendo luzes para o fato, não
necessariamente uma pesquisa inovadora, mas certamente um
olhar único: o olhar do pesquisador. A solução virá,
como veio no meu caso, mas não como um produto ou uma
receita de bolo, mas como uma sugestão, uma percepção,
uma espécie de “clarividência” que só o pesquisador
pode obter pela sua trajetória em cima do tal problema.
E olha, esse foi um dos principais aprendizados que obtive
com o mestrado. Olhar o problema, exauri-lo, entender tudo o
que está acontecendo – no caso do campo da IHC, com o usuário
– para poder de fato gerar uma solução apropriada. É
verdade que na vida profissional não temos dois anos pra
isso (quiçá dois dias!!), mas ficou o “vício”, uma
nova forma de pensar. E mais! Depois do alívio da defesa,
de jurar que “agora nem tão cedo”, fica aquele gostinho
quero mais. Não consigo mais viver sem ler, pesquisar,
escrever... É sem dúvida um mundo novo e fascinante! Quer
se aventurar? [Webinsider]
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